Militares se preparam para uma tentativa de invasão contra a AMAZÔNIA e contam com civis para garantir a sustentação do combate
Conversando um pouco sobre Amazônia, sociedade civil e defesa nacional
Qualquer militar brasileiro ou civil que se debruce sobre assuntos militares sabe muito bem que uma das principais preocupações de hoje é criar meios para proteger a Amazônia contra uma força armada com capacidade superior.
Ainda em 1989, na conferência de Haia, os franceses afirmaram “que os detentores das florestas tropicais úmidas devem compreender que sua soberania sobre elas é relativa”. Em 1990 o presidente George Bush interferiu diretamente em negócios brasileiros e impediu financiamentos japoneses para a construção de uma grande rodovia ligando o Brasil ao Peru, esta seria a primeira rodovia do Pacífico até a região amazônica. A alegação era de que a obra acarretaria destruição à floresta Amazônica. Em 1991 ouviu-se do Chanceler alemão Helmut Kohl que “os países que constituem o Grupo dos Sete precisam buscar um acordo com o Governo Brasileiro para que as regras para a administração da Amazônia sejam estabelecidas“. E a coisa é mais atual do que se imagina, todos se lembram das declarações recentes do presidente francês Emmanuel Macron (Agosto de 2019), alegando que a Amazônia é um patrimônio internacional.
Diferente de outras regiões brasileiras também riquíssimas no quesito recursos naturais, a Amazônia possui alguns atrativos especiais, entre eles o de conter grandes vazios demográficos e possuir fronteiras terrestres com vários outros países.
Quando se conversa sobre proteção da Amazônia, cientes de que não possuímos forças armadas entre as mais poderosas do planeta e de que somos signatários de tratados sobre alcance de mísseis que nos limitam à defesa na faixa dos 300 quilômetros, nos impedindo de rechaçar uma força invasora antes que se aproxime muito de nosso território, um dos termos mais utilizados por militares é o chamado combate de resistência, que se caracteriza pelo fato de nele se desenvolver ações militares voltadas para um conflito prolongado que visa a obter a vitória pelo enfraquecimento moral, físico e material do inimigo que já se encontra dentro do nosso território.
Ver o artigo do Cel Rocha Paiva – Não temos possibilidade de nos defender. Denuncia de coronel do Exército Brasileiro.
Quem é militar e já navegou pela Amazônia sabe muito bem o anseio em estar cada vez mais habituado com a localização, profundidade e demais características dos rios e inúmeros canais e igarapés que – quem sabe – um dia podem fazer parte de uma barreira quase intransponível contra quem ouse se aventurar por essas bandas ao mesmo tempo que nos permitiria causar grande estragos em uma esquadra estacionada ou navegando em nossos grandes rios.
Seguindo essa mentalidade, desenvolvida em praticamente todos os militares brasileiros que já serviram na Amazônia, o esforço para elaboração de doutrinas nessa linha é bastante intenso e se faz sobre um cenário hipotético no qual a Amazônia seria invadida por uma coalizão de países com poderio bélico superior e que declararia a região como de “interesse internacional”.
O general de divisão Luis Eduardo Rocha Paiva, o mesmo que bem recentemente foi chamado de melancia pelo presidente Bolsonaro, é um dos que já se debruçou bastante sobre esse tema. Ainda no início dos anos 2000, quando exercia o cargo de Comandante da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, o militar disse: “A guerra de resistência é de aplicação em qualquer parte do território nacional onde exista a presença de um poder político, militar, contra o qual você não tenha condições, com seus meios convencionais, de fazer face a ele… O que nós estamos fazendo aqui é estudando e vendo como ela pode ser adaptada para a nossa realidade”.
Que ninguém se engane, para a implementação de uma guerra de resistência as forças armadas contam com o protagonismo da sociedade civil. Com militares infiltrados entre a população o exército de resistência atua usando técnicas da guerra de guerrilha, aplicando a surpresa e a agressividade ao máximo, focando-se principalmente onde o exército invasor apresentar vulnerabilidades, desmobilizando-se após isso de maneira rápida e se retraindo, misturando-se novamente com a população local.
As ações cívico sociais, que ajudam na aproximação das forças armadas com as populações tradicionais são indispensáveis para que – caso necessário – haja maior facilidade no recrutamento de apoiadores. Também a simples oportunidade, pouquíssimo mencionada, para que a população local tenha condições de adquirir armas legalizadas já cria mais um elemento de dissuasão importante para que nações “aventureiras” reflitam mais um pouco sobre se aproximar de nosso território. Em uma guerra de resistência a sociedade civil pode ser utilizada tanto no apoio logístico – força de sustentação – às forças principais como também efetivamente atuando na chamada força subterrânea.
Dados importantes, questões importantes
Pesquisa que fez parte de monografia apresentada em 2017 à Escola de aperfeiçoamento de Oficiais apurou (por meio de amostra) que mais de 70% dos militares da Força Terrestre com especialidade em guerra na selva consideram que o Exército teria problemas para mobilizar, concentrar e movimentar tropas para o emprego em uma situação de Estratégia de Resistência. Outro dado importante apurado pela mesma pesquisa mostra que 88% acreditam que “a tropa não está capacitada, no que tange ao adestramento, para o Combate de Resistência”.
Oficiais mais antigos, geralmente na reserva, contestam se há realmente a necessidade de franquear para nações amigas a oportunidade de se realizar cursos de guerra na selva em nossas instituições de ensino. Mesmo que se alegue que “o pulo do gato” não será para eles revelado, para qualquer um fica obvio que são ministradas técnicas de deslocamento e combate em nosso terreno além de familiarização com o meio ambiente.
Uma guerra romantizada
Ainda que a vista da sociedade civil a guerra de resistência seja um tanto quanto romantizada, justamente por contar com a sua participação bem como pela agilidade e improvisação descritas em muitas películas de cinema, cremos que em hipótese alguma um país pode deixar de buscar evitar que se chegue ao ponto de implementar esse tipo de embate. É imprescindível possuir forças armadas com condições mínimas para se fazer respeitado e impor seus interesses como nação.
O ideal é que o inimigo não chegue a colocar os pés em nosso território, de forma que jamais seja necessário apelar para a guerra de resistência.
Ressaltando a evidente ênfase dada ao adestramento voltado para a guerra de resistência em contraste com a aparente fala de esforço em livrar o país de amarras/acordos/tratados internacionais que não permitem que desenvolvamos uma estratégia realmente eficaz de defesa, termino esse breve bate papo com um excerto de texto do coronel Hélio de Souza Filho, onde adverte que “O governo que estabelece como estratégia militar para derrotar o adversário a luta de resistência, reconhece sua fraqueza e, tendo ciência de sua debilidade, abdica de seu dever de prevenir-se, não poderá, até por razões morais, conduzir uma campanha, cuja tônica é a renúncia e a obstinação, em que o sacrifício pessoal é uma constante e irremediável condição de prosseguimento do combate… fica claro que a guerra de resistência não é opção de governo e sim de alternativa da população subjugada”.
SOUZA FILHO, Hélio. A CONDUÇÃO DA GUERRA DE RESISTÊNCIA SEM APOIO GOVERNAMENTAL. ECEME, 2006
BACOVICZ BUENO, Daison Ricardo. O Batalhão De Infantaria de Selva no Combate De Resistência, Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, 2017.
Robson Augusto é Militar R1, serviu 12 anos na Amazônia atuando principalmente na Calha Norte do Amazonas / Arquipélago do Marajó. Formado na Universidade Federal do Amapá e Universidade Federal do Pará