“todos os militares tem direito a uma carreira, teve um oficial que pediu aposentadora… Mas a Marinha ainda assim não faz nada e nem atende os pedidos… O pessoal fica preso, uma carreira parada… sem carreira. São vários casos. O pessoal vai pedindo as contas e vai de baixa… oficiais com mais de 20 anos de carreira… esse pessoal não consegue nada, a Marinha discrimina mesmo… “
Ao atravessar a ponte que separa a histórica fortaleza de Nossa Senhora da Conceição de Villegagnon do continente, bem ao lado do Aeroporto Santos Dumont, os novos alunos da Escola Naval passam a fazer parte da elite das Forças Armadas. A Marinha do Futuro é uma das frases usadas para definir os jovens que estudam na instituição, que é um dos mais renomados centros de formação da elite militar brasileira.
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Os jovens aspirantes têm como alguns de seus principais sonhos estar a frente de um navio de guerra, comandar contingentes de fuzileiros navais etc.
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Infelizmente, para um pequeno grupo de oficiais formados na prestigiosa academia, o sonho durou muito pouco. Foram obrigados a “estacionar” no posto de capitão, sem perspectivas de ascensão na carreira. Por motivos como ter se candidatado a cargo eletivo, problemas pessoais ou mesmo questões psicológicas, esses oficiais não realizaram ou tiveram que interromper o curso de Aperfeiçoamento (C-Ap), que é um requisito exigido para ascensão aos postos mais acima.
O que aparentemente poderia ser resolvido de forma simples, como uma matrícula no mesmo curso em um momento posterior, acabou se transformando em um pesadelo sem fim. Alguns possuem amigos da mesma turma que já são oficiais superiores no ultimo posto da carreira normal.
Lixo atômico
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Segundo as informações recebidas de um militar que faz parte do grupo, a Marinha do Brasil faz questão atirá-los no esquecimento. São o chamado “lixo atômico”, que ninguém quer e que ninguém sabe direito como tratar. Também ouvido pela revista sob a condição de anonimato, um oficial superior da ativa, igualmente oriundo da Escola Naval, confirmou que o fato de decidir adiar a realização de um curso por questões pessoais e até se candidatar para um cargo eletivo pode ser interpretado como uma espécie de afronta contra as tradições e contra a própria cúpula da força naval. Diz ainda que de fato esses capitães – se nada extraordinário acontecer – tendem a permanecer “sem carreira, no mesmo posto até o fim de sua vida”.
O oficial que fez a denúncia conta que frequentemente solicitam à Diretoria de Pessoal da Marinha a realização do curso perdido, que não enxergam qualquer impedimento para que isso ocorra, que os requerimentos demoram cerca de um ano pra ser analisados, mas que invariavelmente a resposta é negativa sem qualquer explicação sobre o embasamento da decisão. Explica ainda que a Marinha estuda melhorias e formas de realizar adaptações para que oficiais de outros quadros possam ascender funcionalmente, mas que para o caso dos capitães EN sem curso de aperfeiçoamento a coisa está estacionada há quase duas décadas.
No Brasil, mesmo para assassinos e estupradores, não há prisão perpétua. Contudo, ao que parece, esses militares são tratados com um extremo de rigor. A impressão que fica é que teriam ofendido alguém muito poderoso, de maneira que nunca mais poderão alcançar o perdão.
A Marinha “simplesmente ignora a nossa existência… no nosso caso nunca ninguém chamou a gente pra conversar… recentemente fizeram um estudo para reestruturar a carreira de oficiais auxiliares… mas continuam ignorando a gente“.
“não pode ser promovido porque não tem o curso, pede o curso a Marinha diz que não pode !!!…”
O Filho do amigo
Só houve uma exceção, conta a fonte. Foi quando a situação dos “sem curso” alcançou o filho de um oficial bem relacionado, amigo do atual Comandante da Marinha. Quando isso ocorreu, quando “um pai conseguiu convencer o almirante, que na época era o Diretor de Pessoal… não podia ficar tão claro que era pra ele (o filho do amigo) aí abriu-se uma brecha na norma interna… todo mundo fez o pedido … claro que a Marinha não deixou muitos fazerem, foi o filho do amigo e mais 4 ou 5… para os demais negou o requerimento… esse pessoal está fadado a morrer capitão, mortos vivos, 17 anos em um posto só! … foi uma sentença perpétua… a lei diz que todos os militares tem direito a uma carreira equilibrada… ”
O oficial termina o depoimento dizendo que geralmente são esquecidos em alguma organização militar considerada como “depósito” de militares “queimados”. Conta ainda que sabe que há os apelidos pejorativos, como o já mencionado lixo atômico ou capitão América, porque o personagem é capitão desde a primeira guerra mundial, sem direito a promoção.
A Revista Sociedade Militar (HOJENAWEB ASSES. E COMUNICAÇÃO) solicitou à Marinha do Brasil mais informações sobre o assunto, como o número de oficiais nessa condição e se há ainda alguma possibilidade de que sejam selecionados para realização dos cursos necessários. Aguardamos ainda as respostas.
Robson Augusto – Sociólogo, jornalista, militar Rrm – Revista Sociedade Militar