“Uma punição secundária de caráter perpétuo!” disse o magistrado.
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As Forças Armadas, normalmente as instituições mais resistentes à adaptação a uma nova realidade de humanização das relações, aos poucos são obrigadas a se curvar ante as exigências do direito, que não estaciona no tempo.
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Um militar do Exército Brasileiro ingressou na justiça alegando que mesmo as punições já cumpridas e administrativamente canceladas permaneciam nos assentamentos dos militares, sendo usadas como fundamento para tomada de decisões e até mesmo novas sanções na forma de preterição em cursos, negativa em pedidos de movimentação e perseguições, que acabam se configurando como re-punições indiretas por conta de infrações disciplinares cometidas em passado longínquo, as vezes 15 ou 20 anos atrás.
O militar alega que sem o cancelamento e retirada dos registros os militares não concorrem em igualdade de condições com seus pares e que assim permanecendo, a punição tem caráter perpétuo.
“De todo modo, verifica-se que o RDE não prevê nenhum prazo para que a anotação da punição aplicada ao militar do Exército, enquadrada no art. 59, conste dos seus assentamentos funcionais, o que acaba lhe impondo uma penalidade secundária de caráter perpétuo”
Alegou o graduado: “ que a legislação castrense disciplinar não permite a retirada junto à ficha disciplinar dos registros sancionatórios prescritos ou extintos pelo cumprimento da punibilidade, ou até mesmo anulados… Deste modo, sustenta que o servidor militar possa ser “reintegrado internamente à sociedade militar ” , concorrendo a direitos e prerrogativas da carreira militar em igualdade de condições com seus demais pares, num ato que representa uma “reabilitação administrativa” após 5 anos do cumprimento de uma punição disciplinar.”
O Exército, entre outras coisas, alegou prescrição, como se o militar solicitasse simples cancelamento de punições, mas a justiça entendeu que as sanções já estavam de fato canceladas e que se tratava apenas de “ ação de natureza declaratória, vez que denota a pretensão de cancelamento dos registros de punições disciplinares por ele sofridas e, portanto, não sujeita ao referido prazo prescricional”.
Na decisão o magistrado coloca: “Assim, aplicando-se o mesmo entendimento ao caso em análise, não se pode macular toda a vida funcional de um agente público militar ao argumento de zelar pela disciplina se este cometeu faltas há mais de 15 anos”.
A decisão foi CONFIRMADA em segunda instância (APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001359-92.2018.4.02.5102/RJ) e abre precedente para que milhares de militares das Forças Armadas deixem de ser preteridos, perseguidos ou re-sancionados por conta de infrações administrativas ocorridas as vezes em seus primeiros anos de militar. Muitas vezes um militar que incorreu em infração disciplinar há 15 ou 20 anos é visto como se fosse a qualquer momento reincidir. “É como se o caráter educativo da sanção administrativa não existisse, é como se ninguém tivesse chance de melhorar, de aprender com os próprios erros “, disse um suboficial ouvido pela revista.
Revista Sociedade Militar