“Durante uma reunião, um coronel pôs a mão na minha perna por baixo da mesa; eu me afastei, olhei com cara feia e os outros oficiais da reunião (todos homens) olharam pra mim sem entender. Eu fiquei com medo de dizer o que havia ocorrido (pois sempre dizem que estamos exagerando) e me calei. Depois, o coronel veio dizer que foi sem querer e pedir desculpas, disse realmente não percebeu.”
Conduzida por dois juízes, Mariana Aquino e Rodrigo Foureaux, a pesquisa que embasa a Campanha Nacional das 10 Medidas contra o Assédio Sexual foi realizada com a participação de quase 2 mil mulheres que atuam nas instituições de segurança pública e Forças Armadas. O resultado pode ser considerado avassalador, pois em pleno século XXI atesta-se que cerca de 74% das mulheres que atuam em instituições ligadas a segurança pública e nas Forças Armadas já sofreram algum tipo de assédio sexual no ambiente de trabalho.
Segundo Mariana Aquino, juíza da Justiça Militar, a pesauisa foi realizada em função da necessidade de levantar dados e informações sobre o assédio sexual nas instituições de segurança pública e Forças Armadas do Brasil.
“Nosso objetivo macro é engajar a população e o Poder Público nessa importante causa e fomentar a adoção de medidas preventivas e de combate a esse tipo de violência no país”, destaca a juíza.
Segundo apurado 83% das mulheres assediadas não denunciaram a situação às instituições principalmente por “não acreditarem na instituição”, “medo de sofrer represália”, “medo de se expor ou de atrapalhar a carreira”. E de fato a pesquisa revelou que a maioria das mulheres que denunciou o assédio sofreu represálias e o assediador não foi punido.
A partir dos depoimentos os organizadores elaboraram nuvens de palavras que destacam os termos mais utilizados pelas mulheres que sofreram assédio para explicar as formas de represálias sofridas após denunciarem o fato.
Veja alguns dados
– Grande parte dos assediadores foram os superiores hierárquicos das profissionais: 85,5%;
– Em relação às posições ocupadas pelas respondentes na ocasião do assédio, —Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e Forças Armadas— a maioria tinha a graduação de soldado (62%), seguido por cabo (11%) e tenente (7%);
– Sobre as consequências que ocorreram depois da denúncia de assédio, 36,9% afirmaram que nenhuma, pois o administrador nada fez contra o assediador; 14,4% responderam nenhuma, pois não havia provas; 11,8% disseram que o assediador foi transferido do local de trabalho por decisão da administração; e 11,5% a assediada foi transferida do local de trabalho por pedido próprio;
– 51% das mulheres responderam que houve represálias após a denúncia do assédio;
– Em relação à busca por apoio médico e psicológico depois de ter sofrido assédio, a maioria (84%) respondeu que não;
– Sobre a sensação de proteção para denunciar o assédio sexual, grande parte das mulheres que já sofreram assédio respondeu que não (78,7%), enquanto 60,5% das respondentes que nunca foram assediadas se sentem seguras para fazer a denúncia;
– A grande maioria das instituições não possui campanha de prevenção e combate ao assédio sexual: 92%;
– Entre as principais formas de assédio, as respondentes citaram: propostas indecentes, insinuações e cantadas; contatos físicos forçados; diversos; uso explícito ou implícito da condição de superior ou do cargo/função; e menção ao corpo da mulher;
– Foram enviados e-mails para a Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, para todas as Polícias Militares, Polícias Civis, Corpos de Bombeiros Militares, Exército, Marinha e Aeronáutica. No total, foram 86 e-mails enviados e apenas 19 deles foram respondidos suficientemente.
Alguns depoimentos dos vários que se encontra no relatório elaborado a partir da pesquisa
“Fui transferida de unidade contra minha vontade, sem explicação, sem
aviso, trazendo grandes transtornos a minha rotina.”
“A testemunha negou tudo, pois precisa da simpatia do comandante para voltar à sua terra natal – sua mãe estava com câncer. Então o resultado foi que eu deveria ser transferida de região.”
“Fui criticada pelo superior, virei motivo de chacota por ele, fui questionada por estar acontecendo aquilo comigo, se foi porque eu dei moral, fui transferida sem a minha vontade, me colocaram para trabalhar como mecânica das viaturas sem ter o menor conhecimento (…).”
“Perseguição, aumento de carga horária, punições de prisão por motivos banais, assédio moral, tendo escala diferente dos demais da equipe, escalações extras, abuso de autoridade etc.”.
A REVISTA completa com os resultados da pesquisa pode ser vista nesse link: https://atividadepolicial.com.br/wp-content/uploads/2020/10/Assedio-Sexual-nas-Instituicoes-de-Seguranca-Publica-e-nas-Forca-Armadas-Revista_da_pesquisa.pdf