O Espírito Militar, de Celso Castro – leitura obrigatória para quem quer entender os militares
Acabei de receber hoje um brinde da Editora Zahar, é um exemplar da nova edição do clássico de Celso Castro, O Espírito Militar.
A obra é resultado da primeira pesquisa etnográfica feita dentro de uma instituição de ensino das Forças Armadas brasileiras. Sob um prisma do próprio aluno-militar que frequentava a AMAN no final dos anos 80, Celso Castro fala sobre o processo de reconstrução da identidade dos militares. Considerado hoje como um clássico sobre o assunto, o livro é utilizado pelos próprios militares na construção de material sobre o processo de ensino e de aprendizagem em academias militares.
O material, de excelente qualidade, não é novidade pra mim (exceto o posfácio inédito), li o livro logo que foi lançado, salvo engano, em 1990 ou 1991. Particularmente me considero devedor intelectual a Celso Castro, Piero Leirner, José Murilo e a vários outros dessa linhagem de pioneiros no estudo sobre os militares brasileiros.
Em oposição a Goffman (Manicômios, prisões e conventos – 1974), Castro acredita que as academias militares são instituições de passagem onde se busca uma “vitória cultural”, ou seja, pretende-se que os formandos saiam de lá completamente transformados a ponto de acreditar que o seu novo modo de ser – agora militarizado – é superior ao anterior, o dos paisanos. Há, portanto, uma oposição simbólica ao “mundo civil”, ao mundo dos “paisanos”, uma luta interna contra aquilo que o neófito-militar luta para jamais voltar a ser.
A passagem pela academia não é fácil e muitos não conseguem resistir, desistem pelo caminho. E Celso Castro destaca que a maior parte dos militares que conseguem se formar mencionam em seus depoimentos palavras como: companheirismo, amizade e camaradagem, que sem dúvida fortalecem um sentimento de cumplicidade, de lealdade de uns para com os outros que perdura até o fim da vida.
As turmas da AMAN visitadas por Castro (1987) já estão em grande parte na reserva remunerada. Alguns poucos, que ocupam hoje o posto de GENERAL DE DIVISÃO, estarão administrando o Exército Brasileiro em cerca de cinco anos.
Muitos estudiosos do assunto procuraram o livro de Castro com o objetivo de entender melhor o que aconteceu dos anos 60 aos 80, o chamado regime militar. Todavia, mais do que uma obra para entender o passado, o livro é uma ferramenta para entender o presente e – quem sabe – ajudar a prever o que pode vir por aí, já que há quem diga que o protagonismo político dos militares, que já é grande, tende ainda a aumentar nos próximos anos.
Robson Augusto (Militar R1,sociólogo, jornalista) / Revista Sociedade Militar