Mais do que dirigir um filme baseado em fatos reais, Clint Eastwood quis recriar os momentos cruciais do atentado terrorista frustrado pela iniciativa de 5 homens (três deles são norte americanos e são o foco do filme).
Isso seria uma tarefa simples se ele, como diretor, usasse atores consagrados ou os recursos que obras do porte de Gran Torino, Menina de Ouro, Sniper Americano e Cartas de Iwo Jima, apenas para citar.
Eastwood foi audaz ao incluir nos papéis principais ninguém menos que os três americanos que colaboraram para evitar uma tragédia inimaginável. Sim, ele convocou os verdadeiros heróis e eles atuam em 15h17 – Trem Para Paris. Parece uma tarefa simples. Reconstituir um fato com quem o viveu, certo?
Errado…
Pôr jovens que nunca atuaram para estrelar um filme, cujo lançamento acontecerá nas principais países do mundo, é uma pressão inimaginável. Os jovens em questão são Anthony Sadler, Alek Skarlatos e Spencer Stone. Felizmente, sob o comando de Clint Eastwood, o resultado foi excepcional, principalmente se levarmos em conta a ação comedida (mas que quando acontece, prende o espectador à poltrona), a inexperiência deles como atores, a precisão cobrada pelo diretor nas interpretações e, sobretudo, o impacto de reviver um momento onde sua vida esteve por um fio.
A história por trás da história
Anthony, Skarlatos e Stone escreveram o livro baseado em suas memórias com a participação do escritor xxx. O livro tem o título em inglês The 15:17 to Paris: The True Story of a Terrorist, a Train, and Three American Heroes. A edição brasileira está à venda em vários sites e em lojas físicas.
Basicamente os acontecimentos são os mesmos que foram relatados em incontáveis jornais do mundo e no próprio livro dos jovens. O dia era 21 de agosto de 2015, data em que o destino colocou o trio (e os outros dois estrangeiros) em rota de colisão com o terrorista Ayoub El Khazzani, um marroquino de 25 anos que estava embarcado no trem com as piores intenções possíveis. El Khazzani portava um fuzil Kalashnikov, muita munição, uma pistola Luger e um estilete. Por ocasião do confronto entre ele e os passageiros, todas as armas foram usadas, algo que destaca o potencial destrutivo do indivíduo.
Mas não é sobre os fatos que todos conhecemos que Clint focou. O diretor usou de forma inteligente o roteiro de Dorothy Blyskal – baseado na obra dos americanos – e criou um filme-documentário, onde a trajetória de fracassos e sucessos deles (que são apenas pessoas comuns) é retratada com muita propriedade.
A jornada do herói (de verdade).
Os três responsáveis pela ação decisiva que impediu um massacre no trem da Thalys com destino à França é reproduzido em uma narrativa linear e com tomadas simples, porém convincentes. No filme, nós somos apresentados ao trio (que inicialmente era uma dupla) composto por Anthony, Skarlatos e Stone. Anthony era um garoto problema, considerado um péssimo exemplo na escola que estudava (cristã). Por sua vez, Skarlatos e Stone eram os alvos dos alunos maiores, vítimas de bullying, mas unidos pelo sofrimento.
No longa-metragem, Clint Eastwood relata um pouco da infância deles, suas aspirações e frustrações. A narrativa nessa parte é rápida e discreta, concedendo ao espectador um pouco de conhecimento sobre o passado de homens que sairiam do anonimato para a fama internacional por um motivo que merece ser valorizado: o heroísmo.
Caso você busque mais informações e vídeos sobre o assunto, irá encontrar até mesmo imagens feitas por Anthony Sadler momentos após a captura de El Khazzani (disponível no final deste review). E eu sei que alguém irá perguntar: então, para que ver o filme se a história toda está disponível em livro, vídeos e matérias de jornais do mundo todo? A resposta a esse questionamento está nas lições e exemplos passados pelo filme.
Ao assistir 15h17 – Trem Para Paris, vocês se depararão com uma história onde o ordinário sai do marasmo, da rotina, e se transforma em algo grandioso. Verão que há coisas em suas vidas que acontecem sem explicação, mas o tempo pode provar que elas tinham um propósito. Compreenderão que a fé é uma força que pode ser usada de forma correta.
As boas lições são abundantes no filme! Meninos problemáticos não estão condenados ao fracasso ou à marginalidade. Com boa educação e uma ideologia de respeito à ordem e à Pátria é possível modificar e moldar uma criança até que ela se torne um adulto capaz de trazer algo produtivo para a sociedade.
Os três não eram homens excepcionais, fato que não os impediu de encarar a morte e lutar pela vida de outros. Isso é muito mais do que a maior parte de nós faremos e serve, sobretudo, de exemplo para que não nos entreguemos ao conformismo.
Clint nos brinda com um filme simples em suas cores, roteiro e atuações. Ao mesmo tempo, ele também deixa um legado pois é um filme que tem potencial de inspirar.
Não espere por ação desenfreada, cenas mirabolantes ou violência extrema. Espere por um filme honesto, bem feito e capaz de nos mostrar que o futuro é algo que pode ser moldado, desde que assim o desejemos.
E claro que não podemos finalizar sem destacar que a amizade foi fundamental para que essa não fosse outra narrativa trágica.
15h17 – Trem Para Paris é um filme inspirador.
Bastidores e entrevistas estão nos vídeos abaixo, além de uma filmagem feita por Anthony Sadler.