Cada vez mais surgem evidências que indicam que pode haver um problema sério de quebra dê confiança entre categorias da base das Forças Armadas e os oficiais generais que ocuparam cargos políticos durante o governo Bolsonaro. O número de processos apresentados à justiça federal requerendo direitos perdidos por conta da lei de remuneração aprovada durante o governo anterior já chega aos milhares e alguns já chegaram no Supremo Tribunal Federal, causando excesso de gastos e trabalho para o judiciário e um grande desgaste político para aqueles parlamentares que defenderam a chamada reestruturação das carreiras.
Nas últimas semanas várias comissões de militares que pertencem às categorias médias e da base das Forças Armadas estiveram reunidos com políticos, entre eles o próprio Presidente da República e o Ministro da Defesa.
Uma reportagem publicada no site o cafezinho mostra uma lista de itens apontados por graduados das forças armadas em reunião com o estado maior do Ministério da defesa. O artigo menciona até que na gestão passada a defesa censurou todos os comentários em um vídeo direcionado à tropa.
Militares da reserva ouvidos pela revista sociedade militar explicam que possuem, garantido pela lei 7524 de 1986, o direito de discutir política e qualquer assunto atinente a sua remuneração e carreiras e isso não se configura como infração disciplinar. Entretanto, invocar palavras como quebra de hierarquia e indisciplina tem sido o artifício de membros da cúpula política militar para impedir que sargentos, suboficiais e oficiais de baixa patente levem até a sociedade e classe política evidências de que a base das FA não tem recebido a mesma atenção que a cúpula no que diz respeito a questões salariais, de carreira e até assistência médica.
Poucos devem se lembrar das palavras do general Rego Barros enquanto era porta-voz do presidente da República Jair Bolsonaro. O oficial declarou na frente de toda a imprensa que não cabia aos estamentos inferiores das forças armadas levar até a sociedade informações sobre problemas enfrentados pela tropa.
“… Não se faz necessário que estamentos mais inferiores da nossa carreira tenham oportunidade de apresentar, de iluminar diretamente a sociedade. Os chefes militares são os responsáveis por isso“, disse o general Rego Barros.
Parlamentares de partidos de esquerda, entre eles Erika Kokay, Fernanda Melchionna e Glauber Braga, têm se movimentado para buscar uma solução para as muitas reclamações de militares das forças armadas, que acusam os oficiais generais políticos que atuaram durante o governo Bolsonaro, de inserir na nova lei de remuneração, conhecida como reestruturação das carreiras, itens que garantiram para a cúpula armada percentuais altíssimos sobre os seus cursos, o que na visão dos oficiais de baixa patente e sargentos se configurou como uma espécie de reajuste disfarçado.
Segundo informações obtidas pela Revista Sociedade Militar, parlamentares do PSOL apresentaram nesta quarta-feira um requerimento solicitando uma audiência pública, foram incluídos na lista de convites o ministro da defesa juristas especializados em causas militares e o presidente do sindicato dos militares das forças armadas;
Glauber Braga tem dito de forma reiterada no Congresso Nacional que o governo Bolsonaro privilegiou as altas patentes e deixou os militares da base das Forças Armadas e suas pensionistas em situação complicada;
Abaixo um trecho do requerimento do deputado Glauber Braga, assinado também por outros parlamentares.
“Senhor Presidente,
Requeiro a V. Exa., nos termos dos artigos 24, III, e 255 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, que seja realizada Audiência Pública, no âmbito desta Comissão, para discutir acerca do sistema de proteção social dos militares brasileiros e os efeitos da Lei nº 13954/2019. Para tanto, sugerem-se os seguintes convidados:
1. José Múcio Monteiro Filho – Ministro de Estado da Defesa;
2. Vanderley Carlos Gonçalves – Diretor da Associação dos Militares das Forças
Armadas do Estado de São Paulo;
3. Cláudio Lino – Representante do Instituto Brasileiro de Análise de Legislações Militares (IBALM);
4. Jéssica Rocha – Especialista em Práticas Jurídicas (Pensionistas);
5. George Brito – Representante do Sindicato dos Militares ReformadosO governo de Jair Bolsonaro, um desastre sem precedentes desde a redemocratização, aprofundou desigualdades em basicamente todos os setores da sociedade. Nem mesmo entre os militares, público destinatário de diversas benesses durante os últimos quatro anos, o tratamento foi igualitário.
Enquanto as altas patentes das Forças Armadas foram agraciadas com cargos e diversos benefícios, o que levou o último governo a ser o que mais possuía militares em cargos civis, os militares de menor graduação e os temporários foram severamente prejudicados, fundamentalmente a partir da reforma do sistema de proteção promovida pelo governo Bolsonaro.
Em dezembro de 2019, entrou em vigor a Lei nº 13954/2019 que altera diversos dispositivos que, dentre outras coisas, regulam o sistema de previdência dos militares. De acordo com a lei, há aumento de alíquota de contribuição, redução no rol de dependentes e dificuldades no reconhecimento dos cursos realizados.”
Robson Augusto – Revista Sociedade Militar