Alguns estudiosos da temática militar citam um episódio aparentemente atípico ocorrido em 2014 na AMAN (Academia Militar das Agulhas Negras), escola militar que forma os oficiais do Exército brasileiro, como marco da atual politização das Forças Armadas.
Segundo essa abordagem, Bolsonaro teria lançado naquele dia, dia de formatura de novos oficiais, ainda que de maneira informal, mas carregada de simbolismo, sua pré-campanha eleitoral.
Bolsonaro não foi o primeiro nem seria o último deputado a tietar os militares e suas cerimônias. Muitos políticos são aficcionados por generais, coronéis, sargentos e soldados.
O inusitado na fala aparentemente improvisada (vista por muitos como um discurso político de ideologia extremada) do então deputado aos futuros tenentes, alguns dos quais dali a poucas décadas serão generais, é que até há alguns anos ele era tido como persona non grata pelos generais que agora o acompanhavam, e que, silenciosamente e de modo subliminar, avalizavam o “mau militar” – no dizer do ex-presidente Ernesto Geisel – como o “candidato ideal da caserna”.
Nas palavras do romancista italiano Giuseppe Lampedusa “tudo deve mudar para que tudo fique como está”. Seguindo essa cartilha, o presidente Lula – que é sabidamente adepto da política do “deixa disso” – escolheu o general Tomás Paiva, contemporâneo de Bolsonaro na AMAN, para “despolitizar o Exército”.
O curioso – ou trágico, se o leitor prefere – nessa “escolha” de Lula é que independentemente do general escolhido a “despolitização das Forças” – expressão cunhada para inglês ver – não vai ser atingida com medidas disciplinares contra componentes isolados da tropa, de modo a satisfazer algum desejo de justiçamento contra a classe.
A “politização dos militares” não significa – como pensam os que ainda têm pesadelos com 1964 – que haverá tanques na rua ou repressão social; significa antes que os oficiais generais querem se apoderar do poder político para além dos muros dos quartéis. As Forças Armadas são para eles apenas um palanque para seus planos pessoais, e agora que descobriram como fazer isso sem sujar as mãos, como bons soldados que são, só precisam recuar temporariamente.
O desconcertante é que o general que está sendo celebrado como o “despolitizador”, aquele que deve fechar os portões da caserna para a política, é o mesmo que em 2014 abriu as portas da Academia de oficiais para o futuro presidente da República, que anos depois veio a derrubar o muro que separava o Soldado do poder;
Artigo de opinião.
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