A sociedade civil e a mídia não especializada em temas militares tem como certo que tudo já está dito sobre a caserna. Mas, mesmo depois de passados os anos de intensa e indevida politização causada pela alta cúpula das Forças Armadas, composta por oficiais generais e coronéis, ainda resta um esqueleto no armário, e ele se chama “praça”.
Ontem, 19 de abril, reuniram-se diversos deputados na Câmara Federal para deliberar sobre os requerimentos propostos e decidir os temas a serem tratados na próxima Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, o chamado Acordo de Procedimentos da CREDN-2023.
Como se sabe, o deputado do PSOL-RJ, Glauber Braga, vem se comprometendo já há alguns anos a ser a voz dos praças das Forças Armadas no Parlamento, pois segundo ele, a reforma previdenciária militar teria “deixado para trás” milhares de suboficiais, sargentos e cabos.
Em requerimento assinado por parlamentares de esquerda, entre eles Erika Kokay e Fernanda Melchionna, pode-se ler algumas das motivações para se convocar o Ministro da Defesa para discutir sobre o sistema de proteção social dos militares brasileiros e os efeitos da Lei nº 13954/2019.
“O governo de Jair Bolsonaro, um desastre sem precedentes desde a redemocratização, aprofundou desigualdades em basicamente todos os setores da sociedade. Nem mesmo entre os militares, público destinatário de diversas benesses durante os últimos quatro anos, o tratamento foi igualitário.”
“Enquanto as altas patentes das Forças Armadas foram agraciadas com cargos e diversos benefícios, o que levou o último governo a ser o que mais possuía militares em cargos civis, os militares de menor graduação e os temporários foram severamente prejudicados, fundamentalmente a partir da reforma do sistema de proteção promovida pelo governo Bolsonaro.”
PERSEGUIÇÃO POLÍTICA NO PARLAMENTO
Imagine o leitor um grupo de cidadãos, atuando em nome de uma categoria profissional de quase 90 mil pessoas, um grupo de brasileiros tão dignos quanto qualquer outro. Imagine que esses cidadãos, prejudicados em seus direitos por um ato do Estado, demandem via representação política no Parlamento que eles possam ser ouvidos em audiência pública para debater assuntos de interesse público relevante.
Imagine finalmente que o presidente de uma comissão instituída no Parlamento se recuse a pautar o requerimento de um político representante desses cidadãos “por duas semanas consecutivas”.
Pois foi exatamente isso que aconteceu no dia 19/04/2023, na reunião para discussão e votação de propostas para a próxima edição da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional.
O deputado requerente é Glauber Braga; os representados, pouco mais de 89 mil militares da reserva das três Forças; e o presidente da Comissão é o deputado Paulo Alexandre Barbosa.
Glauber Braga afirmou que iria “iniciar de imediato um processo de obstrução ordinária de pauta”, caso seu requerimento não fosse pautado. Obstrução pode ser entendida como a utilização, pelos parlamentares, de todos os meios regimentais para protelar ou evitar a votação de determinada matéria.
Segundo o deputado Glauber é incomum, “não é praxe não pautar um requerimento de audiência pública”. Ele também disse que teria havido “uma interlocução do Ministério da Defesa junto” ao presidente da CREDN (Paulo Alexandre Barbosa) “para que o requerimento (da audiência referente à Lei nº 13.954) não fosse pautado”.
O deputado do PSOL disse “esperar que tal interlocução não seja verdade, já que isso representaria uma ingerência do Ministério [da Defesa] na articulação e na definição da pauta da CREDN”, e pressionou o presidente da Comissão, dizendo:
“Qual é o motivo que leva o requerimento que eu apresentei, que discute a situação de praças das Forças Armadas e da lei que deixou praças pelo caminho, que ele não possa ser pautado e que representantes das associações sejam ouvidos?”.
Por fim, Glauber Braga perguntou se o o deputado Paulo Alexandre Barbosa “tinha alguma coisa contra os praças das Forças Armadas” e afirmou que o presidente da CREDN estaria “perseguindo praças das Forças Armadas, ao rejeitar a pautação de um requerimento de audiência pública”.
“ESTREITANDO RELAÇÕES”
O fato é que 24 horas antes de se iniciarem os trabalhos de discussão e votação de propostas da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional o presidente da referida Comissão se encontrou com o comandante da Força Aérea Tenente-Brigadeiro Damasceno e com o Ministro da Defesa José Múcio, como se pode ver pelas imagens no twitter @pauloabarbosa.