O Alto Comando do Exército (ACE) do Brasil é formado pelo Comandante do Exército e pelos generais de exército (generais de 4 estrelas) em serviço ativo. Atualmente existem quinze cargos de general de exército na Força, além de um cargo no Ministério da Defesa.
Esse colegiado é o órgão de assessoramento superior e permanente, que se destina a assessorar o Comandante do Exército nos assuntos relevantes da Força e a selecionar os candidatos ao ingresso e às listas de promoção nos quadros de oficiais generais, que posteriormente são submetidas à aprovação do Presidente da República. O ACE reúne-se, em princípio, bimestralmente.
Sendo um “órgão de assessoramento”, o ACE tem regulamentação estabelecida por portaria interna do Exército.
O decreto que criou o ACE foi assinado por Getúlio Vargas, em 1952. Nesse decreto, o artigo 13 tratava do grau de sigilo da seguinte maneira: “os trabalhos do Alto Comando do Exército, e de seus Conselhos, serão sempre de caráter secreto.”
O atual Regulamento para o Alto Comando do Exército (R-189) define em seu artigo 7º que “os trabalhos e documentos elaborados durante a reunião do ACE” [apelidada de RACE] “serão tratados como informações preparatórias de acesso restrito, independente de classificação em grau de sigilo”. Ou seja, o caráter sigiloso da RACE permaneceu, mesmo estando em vigor a lei de acesso à informação, Lei nº 12.527/2011.
Pois é com base nesse descompasso entre a visão dos generais sobre até onde pode ir a democracia participativa e o ordenamento constitucional vigente que um advogado entrou com um processo judicial contra o Exército para que a Força desclassifique, isto é, retire o caráter de sigilo e torne pública a Ata da RACE de nº 56, realizada em 08/03/1996. Mas, o que haveria de tão importante nessa RACE?
O CASO VARGINHA
“Nas primeiras horas do dia 20 de janeiro de 1996, um OVNI caiu na cidade de Varginha/MG. Poucos minutos depois, helicópteros e caminhões com tropas do Exército brasileiro chegaram ao local da queda.
“Por volta das 10:30h do mesmo dia 20, uma equipe do Exército, liderada pelo capitão Ramires, dirigiu-se ao [bairro] Jardim Andere e capturou duas criaturas extraterrestres, posteriormente levando-as ao hospital Humanitas.
“Por volta das 20:00h do mesmo dia 20, os soldados da PMMG Eric Lopes e Marco Eli Chereze capturaram outra criatura extraterrestre próximo ao jardim Andere, levadas posteriormente ao mesmo hospital.
“No dia 23 de janeiro de 1996, as criaturas extraterrestres foram levadas para Campinas/SP por uma equipe do Exército liderada pelo tenente Tibério. Chegando a Campinas, foram levadas para a Unicamp, onde foram examinadas ou autopsiadas pela equipe médica liderada pelo dr. Badan Palhares. Posteriormente o OVNI/NAVE e duas criaturas extraterrestres foram levadas para a Área 51 dos EUA. A criatura que ficou no Brasil foi levada para a base de segurança máxima da Marinha, localizada em Iperó/SP.”
O texto acima, entre aspas, consta do processo nº 5036515-93.2021.4.04.7200/SC, consultável no TRF4. O processo foi deflagrado pelo advogado brasileiro, Rafael Zatarian Pederneiras, com objetivo de desclassificar documentos ultrassecretos do Exército supostamente relacionados ao “caso Varginha”.
Segundo o advogado, os eventos ocorridos no interior mineiro foram discutidos na RACE realizada em 08/03/1996. Ele também afirma que o Exército brasileiro, mantendo o segredo, viola a lei de acesso à informação, bem como os princípios da publicidade e moralidade constitucionais.
Em 2018, um requerimento feito pelo deputado Chico Alencar (PSOL) solicitou ao Ministério da Defesa a quebra de sigilo da mesma ata da 56ª Reunião do Alto Comando do Exército, que teria informações sobre o evento ocorrido em Varginha.
Segundo o deputado, a “falta de informação pública sobre o caso, tido como verídico por grande parte da população de Varginha, traz como resultado o preconceito, ridicularização, constrangimento, dor e dúvida entre testemunhas e parentes das pessoas diretamente envolvidas, como a família do policial militar Marco Eli Chereze, que teria sido uma vítima fatal de contato direto com um dos tripulantes” do suposto OVNI.
Porém, além das questões pessoais, legais ou científicas que possam envolver o caso, algo ainda mais grave pode estar no cerne desse sigilo.
SOBERANIA PARA GRINGO VER
Tanto o processo judicial assinado pelo advogado quanto o requerimento feito pelo deputado têm como alvo principal a publicidade dos atos e fatos ocorridos em 1996 e seus desdobramentos.
Segundo consta nesses documentos, o destino final das apreensões supostamente efetuadas pelos militares brasileiros teria sido um país estrangeiro, os EUA. Caso isso venha a se confirmar, estaríamos diante de uma grave constatação, a de que oficiais generais do Exército brasileiro teriam participado ativamente (ou por omissão) de uma provável quebra de soberania nacional, ignorando totalmente os canais normais do poder governamental e exorbitando de suas competências.
Reportagem da Revista Sociedade Militar tratou também de tema semelhante em 2022, mas a Força armada envolvida dessa vez foi a Marinha do Brasil.