A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados realizou um seminário em 16 de agosto para discutir os “Limites Constitucionais das Forças Armadas na Política”. O evento foi solicitado pelo presidente da comissão, deputado Rui Falcão (PT-SP), com o objetivo de esclarecer o papel das Forças Armadas na Constituição.
O seminário se transformou em um campo de embate intelectual, onde os participantes debateram acaloradamente a posição das Forças Armadas no contexto político. O ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, assumiu a tribuna com uma abordagem um tanto espalhafatosa, destacando a importância de manter as Forças Armadas afastadas da esfera política.
Santa Cruz contra o Poder Moderador
Durante evento, o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, teve a oportunidade de falar da importância da Constituição de 1988 e a necessidade de separar a política das Forças Armadas.
Santa Cruz empregou argumentos conhecidos, visando contestar qualquer interpretação do Artigo 142 da Constituição que confere um pressuposto “Poder Moderador” às Forças Armadas. De acordo com ele, tal interpretação não era desejada nem mesmo pelas próprias Forças Armadas.
Ele enfatizou ainda, de maneira contundente, que não havia espaço para intervenções militares dentro do quadro constitucional vigente.
“E aí o meu estarrecimento com a volta desse debate… Eu quero ser muito claro: não há interpretação possível que empreste esse Poder Moderador, que as próprias Forças Armadas não desejam… não há intervenção militar constitucional… não existe. O texto de 88 trata das hipóteses de atuação das Forças Armadas, depois modificado também para as GLO’s, nas hipóteses que são chamadas de urgência, e todas elas delimitadas a uma situação específica e por tempo específico. Esse poder de unidade do presidente do seu comando… é relativizado para todos os poderes, quando necessário, para garantia da lei da ordem no país.”, afirmou Santa Cruz.
Réplica do general Etchegoyen
O general reformado do Exército, Sérgio Etchegoyen, sustentou que a interpretação do Artigo 142 não atribui às Forças Armadas o mencionado “Poder Moderador”, mencionando que tal perspectiva não tinha origem nas próprias forças militares, mas sim em uma interpretação de um “jurista famoso, célebre” — referindo-se ao Dr. Ives Gandra Martins. Ele descartou o símbolo dessa interpretação e argumentou que, ao longo de sua vida, nunca se partiu com essa noção dentro do âmbito militar.
“Existe, Dr Felipe Santa Cruz… a sua surpresa para tratar desse assunto não foi maior que a minha, porque nunca, em 50 anos de vida militar, eu sentei em qualquer banco escolar, ou qualquer reunião de trabalho, em que isso tenha sido questionado, conversado ou discutido. Então, o Poder Moderador, que passou a fazer parte de uma narrativa, num determinado momento, é o que eu chamo de “não assunto”, porque nunca esteve presente na minha vida.
Acerca do responsável pela divulgação da “narrativa” acerca do Poder Moderador das Forças Armadas:
“Existe um jurista famoso, célebre, que tem uma interpretação, e tem todo o direito de tê-la, existe a interpretação que vale, que é a interpretação do Supremo Tribunal Federal, e existe interpretação que eu sempre ouvi no meio militar, que frequentei desde nascer — eu sou neto e filho de oficiais do Exército. Nunca ouvi dizer, nunca se discutiu que nas constituições que eu acompanhei ao longo da minha vida, que eu estudei como aluno em 67, depois 69 e 88, que isso tenha sido atribuído às Forças Armadas.“, concluiu Etchegoyen.
Convergência de Opiniões
Apesar das discordâncias acentuadas, ambos os debatedores convergiram em um ponto: a necessidade de uma definição mais clara do papel das Forças Armadas na Constituição. Santa Cruz defendeu a separação estrita entre política e militarismo, enquanto Etchegoyen enfatizou a interpretação fornecida pelo Supremo Tribunal Federal como o caminho a seguir.
Além dos desacordos, o seminário abriu espaço para a discussão de propostas futuras, como possíveis revisões nas Garantias da Lei e da Ordem (GLOs) e na participação de militares na reserva em atividades políticas.
O evento ofereceu uma plataforma para explorar a complexidade do papel das Forças Armadas na política brasileira, trazendo à luz diferentes perspectivas e interpretações. Neste contexto, o confronto verbal entre Felipe Santa Cruz e Sérgio Etchegoyen se destacou como um dos momentos de maior tensão e interesse.
Outros discursos, outras opiniões presentes no seminário podem ser encontradas no vídeo abaixo.