Uma série de vídeos conspiracionistas nas redes sociais estão criando um verdadeiro alarde em volta dos incêndios florestais no Maui. Os vídeos, postados principalmente no Tik Tok, propõe que os incêndios foram criados intencionalmente como parte de um grande esquema de apropriação de terras.
Embora a causa ainda não tenha sido determinada, os incêndios florestais são uma preocupação para os mauianos já há bastante tempo. O Maui foi recentemente castigado por ventos fortes causados pelo furacão Dora. Ao mesmo tempo, a região enfrenta seca severa.
Ainda assim, as teorias da conspiração continuam a circular, em meio aos relatos que quase 400 pessoas ainda estão desaparecidas.
A Revista Sociedade Militar decidiu investigar a fundo essa história.
Desinformação
Não é incomum que teorias da conspiração circulem após uma crise dessa magnitude. De acordo com Renee DiResta, gerente de pesquisa da Universidade de Stanford que estuda esse fenômeno, é uma tendência natural das pessoas procurar dar sentido ao mundo quando estão ansiosas ou sentindo-se impotentes.
“As teorias que atribuem a causa de uma crise a um mau ator específico oferecem um vilão para culpar, alguém a quem potencialmente responsabilizar”, disse DiResta. “As teorias da conspiração mais eficazes e plausíveis geralmente são baseadas em algum grão de verdade e se conectam a algum conjunto existente de crenças sobre o mundo.”, concluiu.
Por exemplo, alguém que desconfia do governo está mais inclinado a acreditar em postagens negativas sobre as agências governamentais. Isso vale pra todo tipo de vilão, imaginário ou não, que as pessoas desenham em suas cabeças: os chineses, os russos, os Rotchfields, a Disney, o globalismo, etc., são exemplos disso.
Nesse caso específico, os teóricos da conspiração de diversas plataformas afirmam que os incêndios, que mataram pelo menos 120 pessoas, foram planeados como parte de um esforço estratégico para eliminar os residentes menos ricos de Maui. O objetivo seria abrir espaço para novos empreendimentos multimilionários.
Como surgiu a teoria do “ataque a laser”
Em um vídeo postado no Tik Tok, um usuário afirmou que um amigo lhe enviou um vídeo de um raio laser “saindo do céu e atingindo diretamente a cidade”. “Este foi um ataque com arma de energia direta”, afirmou o usuário. O vídeo recebeu um rótulo do Instagram listando-o como “informação falsa”.
As imagens na verdade são de um lançamento feito pela SpaceX na Califórnia.
Teorias absurdas relacionadas dizem que os tais “raios laser” foram programados para não atingir nada azul, “explicando” por que tantos guarda-sóis azuis permaneceram ilesos pelos incêndios. Essa seria a teoria que está por trás da ideia que a ilha foi atingida por um “ataque” de arma de energia direcionada.
Outros usuários de redes sociais alegam que os residentes da elite de Maui estavam por trás dos incêndios para que pudessem comprar os terrenos destruídos com desconto e potencialmente reconstruir uma “cidade inteligente”.
Avaliação de Especialistas
Todavia, os incêndios florestais não pouparam apenas coisas azuis. Inúmeras fotos e vídeos demonstram claramente edifícios e objetos de muitas cores que sobreviveram, e também outros igualmente de cores variadas que foram destruídos, inclusive azuis. A verdade é que, embora lasers em geral afetem os materiais de maneira diferente, uma arma que fosse poderosa o suficiente para causar tais danos ainda queimaria itens de qualquer tonalidade, de acordo com um especialista ouvido pela agência Associated Press.
É fácil, contudo, entender esse processo. Uma rápida pesquisa no Google retorna diversas imagens com casas e objetos inegavelmente de todas as cores que foram destruídos ou que sobreviveram aos incêndios.
Nas imagens em que é possível ver casas e carros totalmente carbonizados, é impossível dizer exatamente o que era azul e o que não era. Nesse caso, a mente humana pode ser iludida através de um fenômeno chamado de “viés de confirmação”: alguém vê as imagens procurando itens azuis queimados e, como não vê, automaticamente assume que o que estava lá não era da cor azul. Isso não seria verdade, mas o cérebro enxerga assim.
Há também pessoas mal intencionadas que utilizam imagens escolhidas a dedo com o intuito de sugerir falsamente que apenas itens azuis “sobreviveram” ao incêndio. Na visão conspiracionista, isso é a prova definitiva de que a ilha havaiana foi sem dúvida vítima de um ataque a laser. As pessoas podem surpreendentemente acreditar nisso de forma honesta. Mas há os que estão apenas em busca apenas de fama ou cliques, que se transformam em dinheiro na mão de conspiracionistas desonestos.
Liberdade de expressão ou informação falsa?
“Em última análise, as redes sociais terão de decidir se querem ser uma organização melhor ou permanecer esta plataforma ‘aberta’ de liberdade de expressão que pode ir contra a ética e os padrões exigidos pelo jornalismo”, disse Michael Inouye, analista da empresa de pesquisa de mercado ABI Research.
“O problema é que, mesmo que algo não seja rotulado como ‘notícia’, alguns ainda interpretarão a opinião pessoal como verdade, o que nos coloca de volta na mesma posição.”, observou posteriormente o especialista.
Assim, não há evidências que sugiram que Maui tenha sido atingido por outra coisa senão incêndios florestais, que foram testemunhados por inúmeros sobreviventes. A tragédia, inclusive, está amplamente documentada sobretudo em vídeos e imagens, mostrando itens de todas as cores, queimados e não queimados.
De qualquer forma, o fenômeno ilustra quão rápido a desinformação pode espalhar após um desastre dessa magnitude.