Notícia do UOL, de 16/6/2022, dizia que o então presidente Jair Bolsonaro reduzira impostos de importação de videogames e acessórios relacionados. Era a quarta vez que Bolsonaro reduzia alíquotas desse setor específico.
Em agosto, Bolsonaro autorizou uma redução nas alíquotas de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) com a justificativa de que a medida incentivaria “o desenvolvimento do segmento de jogos eletrônicos no país – o ramo do setor de entretenimento que mais cresce no mundo”.
Voltando um pouco no tempo, encontramos publicações em grandes portais de informação, como o Globo, por exemplo, mostrando que nos dois primeiros anos de governo as reduções de impostos sobre os jogos eletrônicos eram recorrentes.
Mesmo com a pandemia de COVID-19 que redesenhou as prioridades da economia brasileira, o Governo manteve a política de redução de impostos para os games. O ministério da Economia previu que a medida implicaria na redução de arrecadação da ordem de R$ 82,9 milhões em 2021. Para 2022, a previsão era de que a redução de tributação seria de R$ 119,5 milhões.
POUCO SANGUE E MUITA GRANA
“Soterrada” entre milhares de documentos da Secretaria-Geral do Exército, cuja missão é “organizar, publicar e divulgar os Boletins do Exército”, encontramos a Portaria nº 110-EME, de 30/04/2020. Essa Portaria foi mencionada em inúmeras reportagens a partir de 2019, quando Jair Bolsonaro (capitão reformado do Exército) tomou posse como Presidente do Brasil.
Essa singela Portaria aprova a Diretriz de Iniciação do Projeto Missão Verde-Oliva e cria a equipe para a realização do Estudo de Viabilidade para o Projeto (EB20-D-08.038). O que é o Projeto Missão Verde-Oliva? A Revista Sociedade Militar publicou uma matéria sobre o Projeto do EB em junho de 2021, que nada mais era do que um game que seria desenvolvido para o Exército Brasileiro.
Segundo a Portaria, fazia-se necessário a procura por outras “mídias” e os jogos eletrônicos apresentavam-se como oportunidades que o Exército Brasileiro poderia aproveitar para ampliar o alcance da sua comunicação social.
Uma das justificativas do Projeto é, como sempre, a mimetização descabida das ideias norte-americanas. O documento cita como “inspirações para o desenvolvimento de um game voltado para atingir as necessidades do Exército Brasileiro” o jogo America´s Army Proving Grounds, do Exército dos Estados Unidos da América (EUA) que contava então com 9 anos de existência e que estava em sua terceira versão.
A Portaria cita que um estudo de 2008 feito pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), chegou à conclusão de que 30% de todos os norte-americanos de 16 a 24 anos tiveram uma impressão mais positiva do Exército por causa do jogo, o que teve mais impacto em recrutas do Exército do que todas as outras formas de divulgação combinadas.
Algumas “premissas” para a criação do jogo Missão Verde-Oliva, citadas na Portaria:
- O game seria em primeira pessoa;
- Os jogadores deveriam ser estimulados a cultuarem os valores do Exército e a respeitar regras de engajamento;
- Ações “mão amiga” estariam presentes, possivelmente com apresentação de pequenos vídeos;
- Os avatares deveriam representar a composição étnica e social da sociedade brasileira;
- O game demonstraria cuidado com a preservação do meio ambiente;
- Nenhuma cena com potencial para gerar desgaste da imagem ou crise institucional deveria estar presente;
- O game não deveria mostrar sangue em demasia para evitar a ideia de violência exagerada;
- O game deveria mostrar combate urbano, mas não em áreas de comunidades em situação de fragilidade social [eufemismo para “favelas”];
- O game deveria ser disponibilizado até 2021.
Reportagem da Folha de SP, três meses depois da Portaria, trazendo esclarecimentos de especialistas no assunto, afirmava que o custo girava entre R$ 10 milhões e R$ 15 milhões, desde que se tratasse de um game enxuto, um protótipo. Caso o Exército realmente estivesse mirando um blockbuster de guerra de alta qualidade, a cifra poderia chegar a R$ 50 milhões.
PROPAGANDA, A ALMA DO “NEGÓCIO”
De volta para o futuro esquecido do Missão Verde-Oliva, deparamo-nos com um texto publicado no EBlog, intitulado “A propaganda como elemento estratégico de guerra”, escrito por um militar da ativa do Exército.
No artigo, o autor descreve o papel da propaganda em esforços de guerra, desde 1914 até a atual guerra Rússia-Ucrânia. Vale a pena citar a parte final do texto, que é sintomático da guerra informacional que parece estar no centro das preocupações do Exército Brasileiro, com ou sem dinheiro:
“Aqui no Brasil, o Exército Brasileiro possui vários órgãos de comunicação social que têm como objetivo informar e divulgar as ações da Instituição para o público interno e externo, tendo à frente o Centro de Comunicação Social do Exército (CCOMSEx), o qual é responsável pela coordenação e gestão das atividades de comunicação social do Exército, incluindo a produção de conteúdos de propaganda para os veículos de comunicação e redes sociais.
“O Exército Brasileiro conta também com a Agência Verde-Oliva, que é a agência de notícias oficial, responsável por produzir e divulgar notícias e informações sobre as atividades institucionais, possuindo emissoras de televisão e rádio, as quais transmitem programação relacionada às atividades da Instituição e à formação de valores militares, incluindo notícias, entrevistas, músicas e programas educativos.
“Soma-se a esses canais a Revista Verde-Oliva, a qual apresenta informações sobre as atividades da Força, bem como artigos sobre temas relacionados à defesa e à segurança nacional. Além desses órgãos, o Exército Brasileiro também possui perfis oficiais nas redes sociais como Facebook, Twitter e Instagram, que são utilizados para divulgar informações e interagir com o público.
“Ressalta-se, ainda, o EBlog, Blog do Exército Brasileiro que, embora não represente a posição oficial da Instituição, é um canal para a livre manifestação de militares e civis sobre temas de interesse, contribuindo para o compartilhamento e o debate de ideias, informações e conhecimentos. Todos esses dispositivos são ferramentas de propaganda e divulgação utilizados pela Força Terrestre.
“Por fim, infere-se que a propaganda é um recurso que mostra-se fundamental em tempos de guerra para mobilizar a Nação, influenciar e conquistar a opinião pública, devendo ser muito bem utilizada desde os tempos de paz, sempre de forma ética, na defesa de causas legítimas e na divulgação de atividades de interesse nacional.”
Texto de JB Reis