O documentário extremamente impactante lançado recentemente na Netflix, que aborda o terrível episódio que ficou conhecido como o “Holocausto Brasileiro“, tem causado um profundo impacto entre espectadores e críticos, trazendo à tona uma das histórias mais sombrias do Brasil. O filme documenta as incríveis atrocidades cometidas contra milhares de pessoas que foram confinadas em condições desumanas no Hospital Colônia de Barbacena, em Minas Gerais, muitas vezes sem qualquer motivo que legítimasse a internação.
Entre os relatos de sobreviventes e familiares, um dos mais emocionantes é o de João Bosco Siqueira, um militar que reencontrou sua mãe, Geralda Siqueira, após quatro décadas de separação, após ela ter sido internada injustamente no manicômio.
Uma história terrível de horror e desumanidade
O Hospital Colônia de Barbacena, que operou de 1903 a 1980, ficou marcado na história do Brasil como um dos lugares mais brutais e desumanos do país. Originalmente o local foi fundado como um sanatório para pessoas de famílias ricas. Entretanto, rapidamente se transformou em um gigantesco e insalubre depósito de seres humanos indesejados pela sociedade. Alcoólatras, homossexuais, mães solteiras, e até mesmo crianças com deficiências eram enviados para o Colônia, muitas vezes por familiares que não queriam cuidar dos mesmos.
As condições no hospital eram incrivelmente terríveis. Internos viviam nus, passavam fome e frio e eram frequentemente submetidos a tratamentos cruéis, como lobotomias e eletrochoques sem anestesia. Em alguns casos, segundo narra a jornalista Daniela Arbex, os pacientes morriam por sufocamento ao tentar se aquecer nas noites frias, amontoados no chão.
Estima-se que o número enorme de 60 mil pessoas morreram no Colônia durante as décadas em que o hospital esteve em operação.
No documentário hoje disponível na Netflix, ex-internos relatam as atrocidades que sofreram. Antônio da Silva, que foi internado no Colônia aos 12 anos, conta como ele e outros pacientes eram submetidos a injeções que causavam terríveis efeitos colaterais, deformando seus corpos. Manuel Nascimento, outro ex-interno, narra com tristeza como foi espancado repetidamente sem razão aparente, e como nunca recebeu uma visita de sua família durante o tempo que esteve no hospital. Esses relatos não apenas revelam a crueldade dos tratamentos, mas também o profundo abandono que essas pessoas sofreram.
O reencontro o militar João Bosco e Geralda Siqueira
Entre tantas histórias de sofrimento, uma das mais tocantes é a de João Bosco Siqueira, um militar na graduação de subtenente e sua mãe, Geralda. João Bosco nasceu no próprio Hospital Colônia de Barbacena, filho de Geralda, que foi internada no manicômio quando ainda era uma adolescente. A jovem havia sido estuprada por seu patrão, um advogado que a enviou para o Colônia para evitar um escândalo. Lá, Geralda deu à luz a João Bosco, mas foi separada de seu filho logo após o parto.
A separação de mãe e filho durou mais de 40 anos. João Bosco cresceu em orfanatos, sem nunca saber a verdadeira história de sua origem. Mas em 2011, graças aos esforços de seus colegas do Corpo de Bombeiros, ele finalmente conseguiu localizar sua mãe. O reencontro aconteceu no dia 11 de novembro daquele ano, em um quartel de bombeiros, diante de dezenas de militares emocionados. O abraço entre João Bosco e Geralda representou o fim de uma busca angustiante e o começo de uma nova fase para ambos.
Geralda, que ainda vive em Barbacena, sofreu inúmeros abusos e torturas durante seu tempo no Colônia, incluindo eletrochoques para silenciar seus protestos contra a separação de seu filho. Apesar de tudo, ela sobreviveu, e hoje, embora marcada pelas cicatrizes do passado, pode desfrutar de uma relação próxima com João Bosco e seus netos. O documentário captura a emoção desse reencontro, que simboliza a resiliência humana diante de tanta dor e injustiça.
A repercussão indignada entre os espectadores: vozes da internet
O documentário não só trouxe à tona uma história pouco conhecida, mas também desencadeou uma onda de reflexões e sentimentos profundos entre aqueles que o assistiram. Muitos espectadores expressaram suas reações nas redes sociais, demonstrando o quanto essa história os afetou.
Um comentário que resume bem o impacto causado foi postado por @scheilataatrasadaanovelaro4784 em uma postagem no Youtube da produção: “Estou assistindo agora… pesquisando sobre autismo, pois tenho dois filhos autistas. Fiquei impactada com esse documentário, pois não tinha conhecido… muito triste.” Este relato revela como o documentário conseguiu tocar em feridas pessoais e sociais que ainda são muito relevantes.
Outro comentário, feito por @user-cs2zs6gh3p, reflete o choque de muitos brasileiros ao descobrirem essa parte oculta da história do país: “É triste saber que a maioria dos brasileiros não tem conhecimento sobre esta tragédia. Eu mesma fiquei sabendo agora por meio deste documentário. Ver como alguns dos sobreviventes ainda estão emocionalmente presos lá e sentem saudades das mesmas pessoas que os abandonaram lá é muito triste. Eu realmente fiquei sem reação diante de tudo isso…”
A reação de @AnaVitoria-zo7kz é igualmente comovente: “Ver os meninos de Oliveira falando me fez chorar”. Este comentário reflete a emoção desencadeada pelo relato das crianças que foram enviadas ao Colônia e que, mesmo após anos de sofrimento, ainda carregam as marcas do que viveram.
Esses comentários e outros muitos não transcritos nesse artigo não apenas destacam a profundidade emocional do documentário, mas também sublinham a necessidade de maior conscientização sobre a existência desse episódio histórico, que por muito tempo foi negligenciado ou ignorado.
O legado do Holocausto Brasileiro
O Hospital Colônia de Barbacena foi fechado nos anos 90 e desde então a cidade mineira tem trabalhado muito para enfrentar seu passado. Um dos antigos pavilhões do hospital foi transformado no Museu da Loucura, que serve como um memorial para as vítimas e um alerta para as gerações futuras. O museu é um espaço dedicado a preservar a memória e relembrar as muitas atrocidades cometidas, com a esperança de que esse conhecimento faça com que a história não se repita.
Robson Augusto – Revista SOCIEDADE MILITAR