O desmanche de navios é uma prática fundamental para a reciclagem de materiais valiosos como aço e cobre, além de ajudar a descomissionar embarcações antigas que não são mais viáveis para modernização. No entanto, por trás dessa indústria essencial, especialmente nos estaleiros de países em desenvolvimento, há uma realidade sombria de condições de trabalho perigosas e desumanas.
Os maiores estaleiros de desmanche do mundo
A prática de desmanchar navios não é novidade, mas sua escala e a eficiência variam drasticamente ao redor do mundo. Em países como os Estados Unidos, estaleiros como o de Brownsville, no Texas, são exemplos de modernidade e segurança. Essa instalação é especializada no desmanche de navios da Marinha dos Estados Unidos, realizando um processo que maximiza o reaproveitamento de aço, cabos elétricos e outros materiais, seguindo rigorosamente as normas de segurança e proteção ambiental.
Entretanto, esses estaleiros, apesar de eficientes, são caros. Isso faz com que muitas empresas e governos busquem alternativas mais baratas em outros países, onde as regulamentações são mais flexíveis e a mão de obra, muito mais barata. Entre os maiores estaleiros de desmanche estão o de Gadani, no Paquistão, o de Chittagong, em Bangladesh, e a praia de Alang, na Índia.
Alang: o destino de metade dos navios do mundo
A praia de Alang, na Índia, é atualmente o maior estaleiro de desmanche do mundo. Cerca de 50% de todos os navios que chegam ao fim de sua vida útil acabam em Alang. O processo de desmanche nesse estaleiro é, no mínimo, brutal. As embarcações são deliberadamente encalhadas na praia durante a maré alta. Quando a maré baixa, os trabalhadores, equipados com ferramentas rudimentares como marretas e maçaricos, começam a desmontar o navio peça por peça.
As condições de trabalho são extremamente perigosas. Relatórios indicam que acidentes fatais são comuns, com pelo menos uma morte por mês registrada. Os trabalhadores enfrentam longas jornadas, de até 14 horas por dia, seis dias por semana, por um salário irrisório de menos de 4 dólares diários. Muitos desses trabalhadores são expostos a materiais tóxicos, já que os navios frequentemente contêm resíduos químicos e gases nocivos. Além disso, o risco de serem esmagados por pedaços de aço é uma ameaça constante.
Gadani e Chittagong: o segundo e terceiro maiores do mundo
O estaleiro de Gadani, no Paquistão, é o terceiro maior do mundo em termos de volume de desmanche de navios. Apesar de sua eficiência, que permite desmanchar completamente um navio de 10 mil toneladas em apenas cinco ou seis semanas, as condições de trabalho em Gadani são similares às de Alang. A falta de regulamentação adequada coloca os trabalhadores em risco constante.
Chittagong, em Bangladesh, é o segundo maior estaleiro em termos de volume e é o que emprega mais pessoas diretamente na tarefa de desmanche. Estima-se que entre 70 e 100 mil pessoas trabalhem na região, realizando o árduo trabalho de desmantelar navios. A exemplo de Alang e Gadani, as condições de trabalho são precárias e o desrespeito às normas de segurança é evidente.
Impactos ambientais e humanos
Além das condições de trabalho perigosas, os estaleiros de desmanche de navios em países como Índia, Paquistão e Bangladesh representam um risco ambiental significativo. Muitos navios ainda contêm resíduos de óleo, produtos químicos e outros materiais tóxicos que podem vazar durante o processo de desmanche, contaminando o solo, a água e o ar. Além disso, a prática comum de encalhar os navios diretamente nas praias contribui para a destruição dos ecossistemas costeiros.
Os impactos sobre os trabalhadores também são devastadores. Muitos deles sofrem com problemas respiratórios, doenças de pele e outras complicações de saúde devido à exposição prolongada a substâncias perigosas. A falta de treinamento adequado e a ausência de equipamentos de proteção tornam essas ocupações uma das mais arriscadas do mundo.
O futuro do desmanche de navios
Há iniciativas em andamento para melhorar as condições de trabalho e reduzir o impacto ambiental dessa indústria. Organizações internacionais, como a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Marítima Internacional (OMI), têm pressionado para que os estaleiros de desmanche adotem práticas mais seguras e sustentáveis.
Uma das principais regulamentações nesse sentido é a Convenção de Hong Kong, adotada pela OMI em 2009, que visa garantir que o desmanche de navios seja feito de maneira segura e ecologicamente correta. No entanto, sua implementação tem sido lenta e muitos dos principais estaleiros, especialmente na Ásia, ainda não cumprem as diretrizes estabelecidas.
Além disso, alguns países têm investido em tecnologias que permitem o desmanche de navios de forma mais automatizada e segura, reduzindo a necessidade de trabalho manual. No entanto, essas inovações ainda não estão amplamente disponíveis nas regiões que mais dependem dessa indústria.
O desmanche de navios é uma indústria essencial, que permite o reaproveitamento de materiais valiosos e evita o acúmulo de embarcações obsoletas nos oceanos. No entanto, as condições de trabalho nos principais estaleiros do mundo, particularmente na Ásia, continuam sendo uma preocupação séria. A falta de regulamentação e a busca por lucros rápidos têm colocado em risco a vida de milhares de trabalhadores, ao mesmo tempo em que contribuem para a degradação ambiental. A implementação de normas mais rígidas e a adoção de tecnologias mais seguras são passos essenciais para garantir um futuro mais sustentável e humano para essa indústria.