A tensão crescente na Península Coreana tem sido motivo de preocupação para a comunidade internacional. Com os Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul mobilizando recursos militares substanciais na região, a pergunta que surge é: por que os Estados Unidos não atacam a Coreia do Norte e eliminam a ameaça? Embora pareça uma solução rápida, o conflito histórico e as complexas dinâmicas militares e geopolíticas na região tornam essa decisão muito mais difícil do que parece.
A guerra da Coreia e suas consequências duradouras
A Guerra da Coreia, que teve início em 1950, foi um dos conflitos mais sangrentos da Guerra Fria. De um lado, estavam os comunistas norte-coreanos, liderados por Kim Il-sung, avô do atual líder Kim Jong-un, apoiados pela China e pela União Soviética. Do outro lado, a Coreia do Sul, sustentada pelos Estados Unidos. A guerra durou pouco mais de três anos, deixando mais de um milhão de militares mortos e quase três milhões de civis entre as vítimas.
Apesar do cessar-fogo em 1953, a guerra nunca terminou oficialmente, resultando na criação de uma zona desmilitarizada (DMZ) entre os dois países, ao longo do paralelo 38. Embora a DMZ seja tecnicamente desarmada, a região ao seu redor se transformou em uma das áreas mais militarizadas do mundo. A Coreia do Norte, em particular, concentrou uma impressionante quantidade de artilharia ao longo de sua fronteira, com muitas dessas armas apontadas diretamente para Seul, a capital sul-coreana.
A vulnerabilidade de Seul
Seul, com uma população de mais de 25 milhões de pessoas em sua região metropolitana, está perigosamente próxima da fronteira com a Coreia do Norte. Especialistas acreditam que entre mil e dois mil canhões norte-coreanos estão prontos para bombardear a cidade a qualquer momento. Esses canhões, embora antigos, são altamente destrutivos, com calibres variando de 170 mm a 300 mm.
Um ataque preventivo dos EUA contra as instalações nucleares da Coreia do Norte seria tecnicamente viável. No entanto, tal ataque desencadearia uma retaliação massiva. Estima-se que, em apenas uma hora após um ataque inicial, Seul poderia ser atingida por mais de 200 mil projéteis explosivos, resultando em um número devastador de vítimas civis. Os estrategistas militares norte-americanos e sul-coreanos sabem que um conflito direto, mesmo sem o uso de armas nucleares, teria consequências catastróficas para a população de Seul.
O papel da artilharia e o dilema militar para os Estados Unidos
A artilharia convencional da Coreia do Norte representa um dos maiores obstáculos para uma intervenção militar direta. Embora a superioridade tecnológica dos EUA e da Coreia do Sul seja inquestionável, a capacidade da Coreia do Norte de lançar um ataque rápido e devastador contra Seul faz com que qualquer operação militar seja extremamente arriscada. Mesmo que os EUA utilizassem bombardeiros estratégicos, como o B-52, para tentar destruir as baterias de artilharia norte-coreanas, o número de peças de artilharia é tão grande que uma eliminação completa em pouco tempo é praticamente impossível.
Além disso, as defesas antiaéreas norte-coreanas estão bem posicionadas, tornando qualquer tentativa de ataque aéreo uma tarefa altamente arriscada. Estima-se que, nas primeiras 24 horas de um conflito, Seul já teria sido severamente atingida, com centenas de milhares de projéteis explosivos e incendiários causando destruição em massa. Mesmo que os centros militares e nucleares da Coreia do Norte fossem destruídos, o impacto sobre Seul seria tão devastador que o custo político e humano poderia inviabilizar a continuidade da campanha militar.
A Geopolítica da região e a hesitação internacional
Outro fator que impede uma ação militar é a posição da China. Embora a relação entre a China e a Coreia do Norte tenha se enfraquecido nos últimos anos, Pequim não tem interesse em ver o regime de Pyongyang colapsar. A China teme que um colapso norte-coreano leve a uma crise de refugiados em sua fronteira e possivelmente resultaria na reunificação da Península Coreana sob influência dos EUA, algo que seria visto como uma ameaça estratégica para Pequim.
Além disso, as guerras modernas são imprevisíveis, com variáveis que muitas vezes escapam ao controle dos comandantes militares. Embora um conflito prolongado eventualmente resultasse na vitória dos EUA e da Coreia do Sul, o custo humano, econômico e político de tal guerra seria exorbitante. A destruição de Seul, uma das maiores cidades do mundo, com dezenas de milhares de civis mortos em poucas horas, criaria uma crise humanitária de proporções gigantescas e poderia minar o apoio internacional à intervenção.
Portanto, a hesitação dos EUA e de seus aliados em atacar a Coreia do Norte não se baseia em uma falta de capacidade militar, mas sim nas consequências desastrosas que um conflito teria, especialmente para os civis sul-coreanos. O regime de Pyongyang sabe disso e tem usado essa vulnerabilidade como uma de suas principais estratégias de dissuasão. Enquanto Seul estiver sob a mira das armas norte-coreanas, qualquer movimento militar contra o regime de Kim Jong-un será cuidadosamente ponderado.
Em última análise, o cenário na Península Coreana permanece tenso, com uma guerra que tecnicamente nunca terminou. O dilema militar, a vulnerabilidade de Seul e a complexidade geopolítica da região continuam a impedir uma solução militar rápida, forçando todas as partes envolvidas a buscarem alternativas diplomáticas, embora o caminho para a paz pareça distante.