Uma extensa reportagem da Mongabay, plataforma de notícias sobre conservação e ciência ambiental sem fins lucrativos sediada nos EUA, denunciou militares brasileiros que estariam envolvidos em uma série de episódios polêmicos que prejudicaram os esforços emergenciais pra enfrentar a crise humanitária na Terra Indígena Yanomami.
A reportagem foi publicada no dia 18 de setembro.
De acordo com André Schroder, que assina a publicação, o desmatamento e a invasão de territórios protegidos dispararam durante o governo Bolsonaro (2019-2023) muito por conta da presença de ex-altos-militares com políticas e retóricas anti-indígenas e anti-ambientais.
Após acusar o governo Bolsonaro de apoiar garimpeiros ilegais que contaminaram rios com mercúrio, causaram violências nas comunidades e infestaram a população indígena de doenças infecciosas, a reportagem trata da tentativa de Lula de defesa dos Yanomamis com emprego de Forças Armadas e agentes de órgãos como Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) e o investimento de mais de R$ 1 bilhão de reais.
No entanto, segundo a Mongabay, “um obstáculo crucial para fazer cumprir a promessa de Lula tem sido a aparente falta de comprometimento dos militares”.
“Reportagem investigativa de Rubens Valente na Agência Pública revelou que as Forças Armadas brasileiras se recusaram a consertar pistas de pouso que poderiam acelerar as entregas de ajuda aos Yanomami e não estão dispostas a entregar milhares de cestas básicas aos indígenas. Os militares também fecharam unilateralmente um posto de abastecimento de combustível , afetando o trabalho dos serviços de saúde de emergência e agências de proteção”.
Segundo Schroder, outra questão importante é o fraco controle do espaço aéreo sobre a Terra Indígena Yanomami, que cobre uma área maior do que Portugal.
“A Força Aérea Brasileira não conseguiu impedir o tráfego aéreo intensivo decolando e pousando em pistas clandestinas em áreas de mineração ilegal, mas também barrou voos de vigilância de organizações que tentam documentar o retorno dos invasores”.
A Mongabay relata que, apesar de ter pelotões em terras Yanomami, “os militares pouco fizeram para combater o garimpo ilegal e nem mesmo protegeram agentes federais de ataques a tiros. Em algumas situações, grupos indígenas tiveram que agir por conta própria para deter invasores”.
Diversos especialistas ouvidos pelo repórter que assinou a matéria confirmaram o suposto desinteresse dos militares em cumprir seu papel constitucional.
“Não temos confiança nos militares (…) Achávamos que as medidas contra o garimpo ilegal funcionariam, mas não há ações efetivas para remover os invasores”, Maurício Ye’kwana, diretor da Hutukara Associação Yanomami
“Os militares negligenciaram a crise na terra Yanomami (…) Em nenhum momento houve retomada do território em áreas dominadas por garimpeiros. Os relatos eram de que as operações ilegais seriam retomadas em breve”, Elaine Moreira, professora de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Brasília
“Os militares são muito resistentes a combater a mineração no território Yanomami (…) Há pelotões de fronteira com homens e equipamentos na terra, mas não houve patrulhas ou repressões nos últimos anos. Essa atitude sugere certa conivência por parte das Forças Armadas brasileiras”, Estêvão Senra, analista sênior do Instituto Socioambiental.
Operação Catrimani II
Desde abril de 2024, centenas de militares estão empenhados para agir de modo preventivo e repressivo contra o garimpo ilegal, os ilícitos transfronteiriços e os crimes ambientais na Terra Indígena Yanomami, em atenimento à Portaria GM-MD número 1511/2024.
Entre as ações estão a entrega de toneladas de suprimentos, tratamento de saúde especializado, detenção de criminosos, apreensão de equipamentos usados pro crime, inutilização de pistas de pouso clandestinas e destruição de equipamentos.
Nesta quinta-feira, 26 de setembro, a FAB (Força Aérea Brasileira) anunciou que o Comando Operacional Catrimani II atingiu no dia 23 de setembro a marca de mais de mil horas de voo em atividades de desintrusão.
Os voos são realizados pelos helicópteros UH-15 Super Cougar, da Marinha do Brasil, HM1 Pantera, do Exército Brasileiro e, da FAB, os helicópteros H-60 Black Hawk e H-36 Caracal, além do avião C-98 Caravan. Segundo a Força Aérea, a distância percorrida pelas aeronaves até o momento foi de aproximadamente 233 mil km ou o equivalente a 5,6 voltas na Terra.
A previsão é de que a fase II da Catrimani vá até 31 de dezembro.