A chegada das tropas norte-coreanas: um “refresco” para a Rússia
De acordo com informações do Pentágono, cerca de 10.000 soldados norte-coreanos estão sendo enviados para a Rússia, com a maioria destinada ao oblast de Kursk, uma região estratégica que tem enfrentado avanços ucranianos desde agosto de 2024. Kursk, que já foi palco de uma das maiores batalhas da Segunda Guerra Mundial, tornou-se novamente um ponto de tensão na geopolítica moderna.
Relatórios da Al Jazeera confirmam que as tropas norte-coreanas já estão começando a chegar na região, com reforços esperados nas próximas semanas. A presença desses soldados representa uma tentativa de aliviar a pressão sobre o exército russo, permitindo que Moscou preserve seus combatentes mais experientes enquanto usa os norte-coreanos para reforçar as linhas de frente.
Putin, por sua vez, tem mantido uma postura ambígua sobre o assunto. Durante uma coletiva de imprensa em outubro, o presidente russo evitou confirmar diretamente a chegada das tropas, afirmando que “o uso de soldados em treinamentos ou exercícios é uma decisão soberana” das partes envolvidas. No entanto, os aliados ocidentais, como a OTAN e a União Europeia, veem a movimentação como uma escalada preocupante da guerra. Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, destacou que a colaboração entre Moscou e Pyongyang exige uma resposta internacional coordenada.
Pyongyang e moscou: o que está em jogo?
A aliança entre Rússia e Coreia do Norte vai além do simples envio de tropas. Segundo análises da AP News, Pyongyang busca algo em troca de sua participação no conflito: tecnologia militar avançada. A Coreia do Norte, conhecida por seu programa nuclear defasado, vê na parceria com Moscou uma oportunidade de obter sistemas modernos que poderiam fortalecer sua capacidade de dissuasão nuclear e militar.
Esse intercâmbio preocupa não apenas a Ucrânia, mas também outros países, como os Estados Unidos, a Coreia do Sul e os membros da OTAN. A possibilidade de que a Coreia do Norte obtenha tecnologias estratégicas para impulsionar seu arsenal é vista como um risco à segurança global, especialmente na Ásia Oriental, onde tensões históricas entre Pyongyang e Seul continuam a definir a política regional.
A entrada da Coreia do Norte no conflito despertou uma reação imediata da Coreia do Sul, que agora enfrenta a perspectiva de um confronto indireto com seu maior inimigo em solo europeu. Durante uma reunião com o presidente polonês Andrzej Duda, o presidente sul-coreano, Yoon Suk-yeol, deixou claro que seu país não ficará passivo diante do que chamou de “provocações norte-coreanas”.
Historicamente, a Coreia do Sul tem mantido uma postura cautelosa em relação à guerra na Ucrânia, limitando sua ajuda a recursos financeiros e humanitários. Em 2024, Seul destinou cerca de 394 milhões de dólares para apoio à Ucrânia, com a maior parte desse montante voltada para reconstrução de infraestrutura e ajuda humanitária. No entanto, a chegada de tropas norte-coreanas à Rússia pode levar a Coreia do Sul a reconsiderar sua posição.
Entre as possibilidades em discussão está o fornecimento de armas à Ucrânia, uma mudança significativa em sua política. Durante a mesma reunião com Duda, Yoon admitiu que seu governo está revisando suas opções “de maneira mais flexível” à luz das atividades militares norte-coreanas. Segundo fontes anônimas citadas pela AP News, isso pode incluir o envio de sistemas de armas defensivas e ofensivas.
Além disso, Seul está explorando formas de colaborar diretamente com Kiev no campo da inteligência militar. A experiência da Coreia do Sul no monitoramento da Coreia do Norte é vista como inestimável para a Ucrânia, especialmente diante da ameaça representada pelas tropas norte-coreanas. Seul também considera enviar pessoal especializado para ajudar a Ucrânia a entender as táticas militares de Pyongyang e até mesmo auxiliar em interrogatórios de soldados norte-coreanos capturados.
A presença de tropas estrangeiras em Kursk complica as perspectivas de uma solução diplomática para o conflito. A Ucrânia vê a região como uma moeda de troca potencial em futuras negociações de paz, mas a intensificação dos combates pode inviabilizar qualquer diálogo significativo.
As barreiras internas da Coreia do Sul
Embora a Coreia do Sul esteja disposta a tomar medidas mais enérgicas, enfrenta desafios internos significativos. A legislação do país impede o envio direto de armas para zonas de conflito. De acordo com especialistas, como Jenny Town, diretora do programa Coreia do Stimson, mudanças legais seriam necessárias para permitir uma ação mais direta de Seul. No entanto, a baixa popularidade do presidente Yoon — com uma taxa de aprovação de apenas 24,1% — pode dificultar a implementação de tais mudanças.
Mesmo assim, o crescente envolvimento da Coreia do Norte no conflito pode pressionar o governo sul-coreano a agir. Se Pyongyang continuar a enviar tropas para a Rússia, a opinião pública sul-coreana pode ver isso como uma ameaça direta, levando a uma revisão das leis atuais.
Um conflito cada vez mais global
A aliança entre Rússia e Coreia do Norte adiciona uma nova camada de complexidade à guerra na Ucrânia. Para Putin, a colaboração com Pyongyang pode parecer uma solução a curto prazo, mas o custo político e estratégico pode ser devastador. A entrada da Coreia do Sul no cenário, mesmo que de forma limitada, demonstra como as ações de Moscou estão transformando um conflito regional em uma guerra com ramificações globais.
A pergunta que fica é: até onde os países envolvidos estão dispostos a ir? Se a Coreia do Sul optar por fornecer armas ou intensificar sua cooperação com a Ucrânia, o conflito pode atingir um novo patamar, trazendo riscos imprevisíveis para a segurança internacional. Seja como for, o erro estratégico de Putin ao buscar apoio de Pyongyang já está tendo consequências que vão muito além das fronteiras da Rússia e da Ucrânia.