O Exército Brasileiro paga atualmente uma pensão militar de R$ 5,6 mil a uma mulher condenada por fraude envolvendo a morte falsa do marido, o terceiro-sargento Gilmar Santos de Braga. O caso, ocorrido em 2015, começou com a apresentação de uma certidão de óbito do militar, que, na verdade, segue vivo até hoje.
Segundo o processo, Dilcineth Guerreiro de Braga, então com 49 anos, apresentou o documento ao Exército, alegando que Gilmar havia morrido atropelado por um carro desgovernado na cidade de Borba, interior do Amazonas. O documento de óbito, embora autêntico, foi obtido de forma fraudulenta. Após a alegação, Dilcineth começou a receber a pensão militar e um auxílio-funeral, causando um prejuízo inicial de R$ 60 mil aos cofres públicos.
A fraude foi descoberta pouco mais de um ano depois, quando um dos filhos do casal denunciou o caso ao Exército. Em julho de 2017, a pensão foi bloqueada, e o golpe foi confirmado após militares encontrarem Gilmar em sua residência, onde ele confessou o crime.
Benefício continua sendo pago por lacuna legal
Apesar da confissão e da condenação por fraude, Gilmar foi expulso do Exército em 2021, o que permitiu que Dilcineth voltasse a receber a pensão. Isso ocorre devido a uma legislação que equipara esposas de militares expulsos ou condenados a viúvas, garantindo-lhes acesso ao benefício previdenciário.
Essa pensão, conhecida como “morte ficta”, tem gerado controvérsia e altos custos para os cofres públicos. Segundo levantamento, o pagamento de pensões desse tipo, incluindo casos de ex-militares condenados por crimes graves como tráfico de drogas e tentativa de estupro, custa cerca de R$ 43 milhões por ano às Forças Armadas.
De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), não há previsão legal para a concessão de pensões por “morte ficta”, e o benefício seria fruto de uma “inércia interpretativa”. Ainda assim, as Forças Armadas continuam utilizando esse expediente com base na Lei nº 3.765/1960, que regula as pensões militares.
Brechas legais estimulam fraudes e geram indignação
O TCU aponta que o benefício pode incentivar condutas inadequadas de militares que buscam se desligar das Forças Armadas antes do tempo de serviço necessário para a reserva remunerada. Essa prática tem causado indignação ao beneficiar familiares de ex-militares condenados por diversos crimes, enquanto militares na ativa só garantem pensão aos seus dependentes em caso de morte real.
No caso de Dilcineth e Gilmar, a fraude foi motivada por dificuldades financeiras enfrentadas pela família. Segundo depoimentos no processo, o objetivo inicial era sacar um seguro de vida de R$ 300 mil, além de obter a pensão e o auxílio-funeral. Após a expulsão de Gilmar, Dilcineth já recebeu mais de R$ 240 mil de pensão até agora.
Questionado sobre o caso, o Exército Brasileiro confirmou que a concessão da pensão segue os critérios legais vigentes. A Força destacou que auditorias são realizadas para prevenir fraudes, mas não houve menção a mudanças na legislação para evitar que benefícios como esse continuem sendo pagos.
Série de fraudes expõe problemas na previdência militar
O caso de Dilcineth e Gilmar é apenas um entre vários escândalos revelados em uma investigação da coluna de Tácio Lorran. Outros episódios incluem fraudes envolvendo casamentos fictícios, uso de documentos falsos e concessão de pensões a pessoas já falecidas.
Apesar das denúncias, os pagamentos continuam a ser realizados devido às brechas na legislação. O TCU e especialistas têm defendido a necessidade de uma revisão completa das normas que regulam o sistema de previdência militar, para evitar prejuízos aos cofres públicos.
Dilcineth, por sua vez, confirmou à reportagem que Gilmar está vivo, mas disse que o casal está separado. Ambos preferiram não comentar sobre o caso ou sobre a condenação que receberam. Enquanto isso, o benefício continua sendo pago, alimentando o debate sobre o uso de recursos públicos e a necessidade de maior controle sobre os gastos militares.
Com informações de: Metropoles