Enquanto o PT estava no poder, maioria significativa dos ministros do STF decidiam constantemente contra os pleitos apresentados pelo partido em favor de seus membros investigados na Operação Lava-Jato. Essa maioria se dizia engajada com a moralizadora operação e foram do STF a liminar para Lula não assumir a Casa Civil no governo Dilma e tantas outras decisões em respaldo às investigações.
Após o impeachment, alguns ministros da Corte passaram a dificultar o andamento da Lava-Jato, particularmente quando as investigações chegaram a membros do MDB e do PSDB, aliando-se a outros cujas relações com o PT são perfeitamente conhecidas. Além dessas ilegítimas ligações partidárias, há fortes indícios de relações pessoais com investigados na Lava-Jato, aos quais são concedidos muitos dos pleitos de suas defesas.
A justiça só vem sendo eficaz contra lideranças políticas corruptas nos escalões abaixo do STF. A Corte Suprema é um cofre forte a proteger os brasileiros mais iguais que os demais perante a lei, pois mantém praticamente paralisados os processos dos privilegiados com o vergonhoso foro especial.
Os eventos que culminaram na sessão de 22 de março da Corte Suprema mostraram que o sonho de um Brasil respeitável só se concretizará se alijarmos as lideranças moralmente enfermas, cujos tentáculos empolgaram altos escalões nos três Poderes da União. Foi um golpe que deixou a nação perplexa e apequenada pela falta de recursos legais para reverter a infame manobra de proteção a um também infame criminoso condenado. Foi a nação e não o STF, como temia a ministra Cármem Lúcia, que se apequenou, o que é muito mais triste.
O tal jeitinho brasileiro mostrou suas danosas consequências quando usado para viabilizar decisões ilegítimas em prol de condenados de colarinho branco. O STF e alguns dos seus ministros têm sido protagonistas do uso e abuso deste mal costume.
O jeitinho foi admitido, também, pelo ministro Lewandowski quando, à revelia da Constituição Federal, aceitou a manobra de senadores para manter os direitos políticos da ex presidente Dilma, após ser cassada no processo de impeachment em 2016.
Outro jeitinho foi o patrocinado pela maioria dos ministros, na decisão que impediu Renan Calheiros de permanecer na linha sucessória da presidência da República, por ser réu, mas lhe permitiu continuar presidente do Senado, cargo previsto, por lei, na citada linha sucessória.
Ora, se o réu Renan Callheiros não pode exercer a presidência da República, nem por alguns dias, não há coerência em autorizar a candidatura de Lula, condenado em 2ª Instância (Ficha Suja) e réu em vários outros processos. Como gostam das luzes da ribalta, aos juristas supremos agrada o debate sobre essa e outras incoerências, pois parecem não se preocupar com a perda de confiança da nação e a insegurança jurídica resultante.
O último jeitinho foi a concessão da liminar para Lula não ser preso até a decisão sobre seu habeas corpus, adiada para 4 de abril. A estranha liminar e o citado adiamento, atendendo a interesses pessoais de alguns ministros, a despeito de seus deveres e dos anseios da nação, foram repudiados pela sociedade e por juristas de renome. Por quê a sessão foi suspensa, se havia quórum para continuá-la? Entretanto, não deveríamos nos surpreender com decisões como essas que blindaram o poderoso chefão, pois somos o país do jeitinho, que já deveria ser coisa do passado, mormente na justiça.
A sociedade não pode mais aceitar ficar à mercê da corrupção e de ilegítimas lideranças de colarinho branco,capa preta ou do que for. O cenário vivido pelo país é o conflito entre essas lideranças, que não merecem o menor respeito e não têm a mínima confiança da nação, e uma sociedade trabalhadora, sacrificada e ainda sonhadora com um Brasil do qual se orgulhe. A organização criminosa refestelada na cúpula do poder vai fazer o possível, usando de sórdidos artifícios, para se ali se manter e continuar usurpando ilegalmente os recursos nacionais.
Os sonhos não caem do céu. Ou a sociedade reage com a firmeza exigida para enobrecer o Brasil, se for necessário, empregando a desobediência civil, resistência passiva e enormes manifestações de rua, ou é melhor parar de sonhar. É a nação que tem que se salvar a si mesma e sem a tutela das Forças Armadas, que só tomarão a iniciativa diante de um quadro de grave violência, caos social, falência e perda de autoridade dos Poderes da União, isto é, um cenário de anomia a colocar em risco a paz interna, a unidade política, os próprios Poderes Constitucionais e a soberania do Estado no território nacional.
Querem esperar que o sangue escorra pelas ruas? Então mãos à obra. Os doutos ministros do STF têm saber jurídico tanto para aceitar quanto para recusar o habeas corpus de Lula na sessão de 4 de abril. Portanto, o comprometimento com o futuro do Brasil é que deve nortear a decisão de cada um.
Cidadãos e cidadãs. Pressionem com força de vontade, exijam senso de responsabilidade e patriotismo do STF e, assim, escrevam com suas honradas mãos essa passagem relevante da História do Brasil. Nossos descendentes terão orgulho de ser brasileiros e nós não teremos vivido em vão.
General da Reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva / Publicado em Revista Sociedade Militar – março de 2018.