Nessa crise político-sanitária-econômica, existem diferentes posições sobre como gerenciá-la. Alguns, automaticamente, defendem as propostas de lideranças políticas e de grupos de interesse conformes com suas próprias linhas de pensamento. Não analisam se as propostas camuflam interesses pessoais, partidários, grupais ou mesmo ideológicos ao arrepio do dever de servir à nação e aos irmãos brasileiros. Por outro lado, não conseguem ter o equilíbrio de conjugar o que cada uma tem de positivo e flexibilizar inteligentemente suas posições.
O cidadão consciente não se atrela, cegamente, a líderes, partidos, grupos ou ideologias, mas sim a princípios, crenças e ideais revestidos de nobreza e dignidade. O apoio a pessoas ou grupos de qualquer natureza não é irrestrito, mas condicionado ao cumprimento de valores morais e cívicos e à atuação em prol da nação, essa sim credora prioritária da lealdade do cidadão.
Em situações extremas como a atual, quando uma solução radical e maniqueísta possa levar o país ao caos, é preciso buscar caminhos alternativos, que mantenham suas benesses, mas neutralizem seus pontos fracos e permitam preservar, também, a saúde do país.
Assistimos a um diálogo de surdos, onde um lado é bem intencionado, mas será prejudicado e enfraquecido se dominado pela presunção e pelo radicalismo. Do outro lado, diversos atores personificam o que há de mais nefasto, fisiológico, patrimonialista e velhaco no cenário político. Não há mais como fugir ao embate político, pois já é a realidade do contexto vivido. Cabe agora gerenciar, não só a crise, mas também o conflito não o escalando, descuidadamente, mas o conduzindo com responsabilidade e sabedoria, de modo a que a sociedade não seja ainda mais prejudicada do que já foi.
No conflito que, desafortunada e irresponsavelmente, a crise se transformou, líderes capazes irão gerenciá-lo negociando com idealismo pragmático, temperado por realismo ético. Tentarão impor-se aos atores da política velhaca, estrategicamente, por manobras indiretas, desequilibrando o adversário não com ataques frontais, que só se empregam quando há total superioridade de meios e esse não é o quadro atual.
O gerenciamento desse conflito não está, logicamente, no campo militar, mas sim nos campos político e psicossocial, onde levará vantagem quem agir de forma sutil e indireta, agindo sobre os pontos sensíveis do adversário, previamente identificados, desequilibrando-o e enfraquecendo-o nos campos citados. Posições e manifestações radicais, sucessivas e impensadas de quem esteja mergulhado emocionalmente na tempestade, não contribuem e podem fortalecer o oponente. Que se ouça o assessoramento do gabinete de crise e se use o porta-voz, deixando para intervir em momentos de decisão a exigir a voz do líder.
Outro problema, uma das maiores ameaças ao êxito no gerenciamento de conflitos, é quando um outro conflito ocorre dentro do próprio gabinete ou entre o líder o gabinete. É uma tarefa difícil, mas não incomum, o líder ter que gerenciar vaidades e interesses pessoais existentes no próprio gabinete de crise, ao tempo em que precisa disciplinar sua própria personalidade.
Eis aí um gerenciamento no gerenciamento.
De: General Reformado Luiz Eduardo Rocha Paiva (Instituto Sagres / Brasília-DF)
Revista Sociedade Militar