E o fogo respinga é nas Forças Armadas
Após décadas de ostracismo na caserna, os militares caíram de paraquedas no picadeiro político graças ao deputado capitão, filhote do centrão fisiológico de Brasília. Generais, almirantes, coronéis, toda a corte camuflada foi transplantada dos porões embolorados e tacanhos dos quartéis direto para o palácio do poder central. Mas quais serão as consequências dessa pororoca institucional? Que reflexos isso pode ter na caserna?
Neste mês que termina, alguns militares estamparam as páginas do noticiário nacional. Alguma conquista bélica? Aquisição de novos equipamentos? Algum motivo de orgulho para a tropa? Nada disso. Apenas mais um episódio deplorável da série “como BolsoNERO incinera as Forças Armadas”. Em um deles, o general Pazzuelo demonstrou ao pagador de impostos que ser um bom soldado não é o mesmo que ser um bom lacaio. Promessas de cargos futuros podem ter afrouxado a válvula de pundonor do ministro general da saúde, permitindo que se anulasse tão servilmente? Só ele tem a resposta. Bolsonaro está à cata de relevância política visando à reeleição, e a politização da “fraudemia” chinesa está se revelando um campo fértil para isso. Desmentir o ministro da saúde (aparentemente alinhado com interesses opostos ao ideário presidencial) pode ter sido uma forma de angariar capital político para 2022.
Certamente não foi esse o caso do ex-boca-de-ferro do Presidente, general Rego Barros, que após ter sido demitido, saiu por aí descendo a ripa no ex-chefe. Com a pompa literária de frequentador da ECEME, num artigo¹ escrito em conhecido jornal, chega a comparar Jair Bolsonaro a César! [Observem que até para criticar, o sujeito é subserviente, e não percebe.] Interessante notar no texto lavrado pelo defenestrado general ministro um tom magoadinho de quem foi “traído”, “esquecido”, “ferido por intrigas palacianas”(!), etc. Mostra-se preocupado com a governança da Nação, já que, anjo de candura que é, descobriu (só depois de ter sido carbonizado pelo monstro planaltino) que os “projetos apresentados nas campanhas eleitorais, com vistas a convencer-nos a depositar (sic) nosso voto nas urnas eletrônicas, são meras peças publicitárias”. Ele também lamenta [eu quase acreditei!] que “aqueles planos são paulatinamente esquecidos diante das dificuldades políticas por implementá-los ou mesmo por outros mesquinhos interesses”. É obviamente mais um histrião camuflado de olho em alguma outra teta pública. Para vermos onde estão os “outros mesquinhos interesses” basta lembrar que os inocentes generais urdiram com o congresso a Lei nº 13.954/2019, que granjeou-lhes 73% de aumento nos salários às custas do pessoal graduado da reserva e das pensionistas.
Finalmente, mas não menos deplorável, foi o caso do secretário-ministro-general Luiz Ramos, que foi carinhosamente apelidado por outro ministro de Maria Fofoca ou em vérnaculo mais condizente com o seu alto posto, arengueiro, boquirroto, coscuvilheiro, turgimão, intrometido… Isso mesmo, parece que o general que barrou o nosso amigo Vereador Fabrício “da Aeronáutica” em setembro² deste ano é o alcoviteiro dessa corte bizarra. Qualidade rara num bom soldado…
Tudo muito pitoresco (para não dizer ridículo!), mas quem paga a conta desse circo equestre? Acertou quem disse “as Forças Armadas”. Não se sabe ainda com certeza o que é e a que veio o “fenômeno” Bolsonaro, mas uma coisa é certa, nunca um comandante supremo fez tão mal à instituição militar. Seja prejudicando o pessoal da base através da Lei nº 13.954/2019, que criou uma lacuna salarial entre reserva e ativa – façanha que nem o PT conseguiu -, seja destruindo a reputação dos oficiais generais que ousam lhe contradizer. As instituições militares são milenares. Modernamente consolidaram-se como mantenedoras do status quo pós revolução burguesa, que derrubou a monarquia absolutista, abrindo assim caminho para a República. Logo depois, a profissionalização militar conduziu à ideação e à construção das identidades nacionais. Um dos motes de campanha presidencial em 2018 foi a luta contra o globalismo, mas a julgar pelo fogo amigo do nosso “governante piromaníaco”¹ parece que o derradeiro bastião do estado nacional forte, isto é, o soldado profissional, está com a reputação mais combalida do que o próprio salário, excetuando-se claro os generais, que perderam em honra o que ganharam em dinheiro. E são esses senhores que queriam 10% a mais no salário para representar bem as Forças Armadas!
Reis – Publicado originalmente no PORTAL MILITAR
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¹https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2020/10/4884811-memento-mori.html