Um documento da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF), emitido no dia 6 de janeiro deste ano, mostra que a área de inteligência enviou alertas sobre a convocação dos atos do dia 8 de janeiro, que aconteceriam dois dias depois. O relatório sugere que Caçadores, Atiradores e Colecionadores, os chamados CACs, manifestaram a intenção de “sitiar Brasília”.
“Circula divulgação sobre a realização dos atos, em Brasília, entre os dias 06 e 8 de janeiro, com vinda de caravanas de outros Estados, em oposição ao atual governo federal. Em desdobramento, a partir do dia 9 de janeiro, estaria prevista a realização de uma “greve geral”. Entre as eventuais ações estariam invasão a órgãos públicos e bloqueio em refinarias e/ou distribuidoras e combustíveis”, diz um resumo do documento.
“Em que pese a mencionada desmobilização, nota-se convocação para novas mobilizações pelas redes sociais e previstas para ocorrer em Brasília contra o atual governo federal”, descreve o relatório, divulgado pelo Correio Brazilianese.
Indícios já no dia 3
A possível manifestação já havia entrado no radar da inteligência no dia 3 de janeiro deste ano, por conta de diversas postagens e de hashtags levantadas no Twitter. No entanto, o relatório detalhou que as informações eram inconsistentes sobre os dias, horários e locais das manifestações.
Contudo, nos próximos dias, a inteligência teria observado situações que apontavam pra uma possível mobilização popular contra o atual governo Lula. No dia 5 de janeiro, por exemplo, apenas três dias antes dos atos do dia 8, foi registrada uma presença incomum de pessoas em frente ao Quartel-General do exército. Além disso, estacionamentos de terra estariam bloqueados e ocupados por tendas. Esses locais teriam sido monitorados utilizando drones.
O monitoramento também era feito por meio das redes sociais. Em uma transmissão realizada ao vivo, os simpatizantes do movimento já citavam possíveis manifestações a partir de 7 de janeiro, indicando a participação de caravanas de diversos estados do país. “Assinala-se ainda grupo de mensagem, no qual os integrantes seriam pessoas conhecidas por CACs (Caçadores, Atiradores e Colecionadores) e com postagens sobre ‘sitiar Brasília’ e que denotam a intenção de prática de atos de violência no dia 8 de janeiro”, destaca o relatório sobre o incidente. Uma convocação, intitulada “Tomada de Poder pelo povo”, previa que a invasão aconteceria no Congresso Nacional. Segundo o monitoramento da Inteligência, os organizadores se autodenominavam “patriotas”.
Greve geral
No documento endereçado à cúpula da SSP, a inteligência constatou haver uma orientação dos manifestantes para que quem fosse participar fosse adulto, com boa condição física, e que não fossem levadas crianças ao ato. Também era vedada a participação “daqueles que apresentam dificuldade de locomoção”. A orientação teria sido dada em grupos de Whatsapp e Telegram. Após os atos, havia também o plano de fazer uma “greve geral”, já no dia 9 de janeiro, similar à greve dos caminhoneiros de 2018.
“Destaca-se que um dos organizadores alega ser liderança entre os caminhoneiros, todavia, como corrobora em eventos passados, o mesmo não tem representatividade junto ao segmento. Outrossim, a divulgação da mobilização prevista ocorreu recentemente (3 de janeiro), e, geralmente, manifestações com prazo exíguo comprometem a organização dos atos, a vinda de caravanas dos outros Estados e a adesão de público geral”, conclui o relatório da inteligência.
Coronel teria enviado alertas pessoalmente
O coronel da Polícia Militar do Distrito Federal, Jorge Henrique da Silva Pinto, disse em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos que chegou a enviar alertas a varios grupos de Whatsapp na véspera dos atos do 8 de janeiro. Ele contradisse uma versão do depoimento do ex-secretário Anderson Torres à Policia Federal, que alegou que não havia sido informado sobre os movimentos que culminariam com a invasão dos prédios dos três poderes.
“Eu avisei que haveria confronto com as forças policiais. Eu mesmo informei. Tanto no grupo Difusão, que era endereçado ao assessoramento do secretário de Segurança Pública, quantos nos demais grupos, onde estava analistas de todos os órgãos”, completou o coronel.
O coronel revelou que, dentro da Secretaria de Segurança Pública, existe uma tabela que mapeia o grau de potencial de manifestações em geral. Nos dias que antecederam os atos de 8 de janeiro, o risco de uma manifestação séria era considerado “baixo” pela equipe, por conta da estimativa ser inferior a de mil pessoas participando.
“Não sei dizer o que houve. O trabalho foi feito, foi desenvolvido, todos os órgãos foram integrados por meio da célula de inteligência justamente para viabilizar o contato dos seus analistas e profissionais de inteligência com os decisores dos demais órgãos. O que eu posso dizer é que a inteligência atuou, não sei dizer quem falhou, mas a inteligência fez todo o trabalho necessário”, alegou o militar.
Anteriormente, o próprio General Tomás Paiva, comandante do Exército, havia determinado ele próprio investigação sobre ações de militares da ativa durante os atos de 8 de janeiro.