As histórias sobre espiões russos, alguns das Forças Armadas, outros agentes, não são novidade, principalmente por causa da Guerra Fria e de Hollywood que ampliaram a mítica sobre o assunto. Mas dessa vez não estamos falando de homens da Marinha, Exército ou Aeronáutica da Rússia, estamos falando de homens e mulheres que são implantados em diversos países do mundo e que sequer são identificados como russos.
São pessoas que falam e conhecem bem a cultura do país onde “nasceram”, permanecem anos no país em que foram alocados e até assumem uma vida comum, têm filhos e estabelecem raízes, segundo relata o jornal El País. Aliás, um desses espiões chegou a fazer negociações com a Marinha do Brasil e o Comando do Exército, de acordo com a Folha de São Paulo.
A paciência e a metodologia por trás desses indivíduos assusta. Além de abdicarem da vida real em seu país natal, esses homens e mulheres adotam novos idiomas, assumem compromissos com outras pessoas, criam laços familiares e ficam “escondidos” de todos aqueles que amavam na Rússia. Alguns dos casos relatados mostram que alguns desses espiões são tão audazes que viajam pelo mundo com outras identidades e tentam se estabelecer em lugares estrategicamente pertinentes, sendo o caso de um deles que tentou ingressar como estagiário na Holanda no Tribunal Penal Internacional.
Recentemente este “brasileiro” foi preso. Seu nome real é Sergey Cherkasov, acusado de espionagem e condenado a uma pena de 15 anos de prisão no Brasil por falsidade documental. Sergey usava no Brasil o nome de Viktor Muller Ferreira e tentou estágio no Tribunal Penal Internacional, do qual a Rússia não faz parte, segundo noticiou o G1.
Há anos que o uso do passaporte brasileiro, como já mencionado aqui na Revista Sociedade Militar, é um dos mais visados por terroristas, espiões e todo tipo de indivíduo mal intencionado. Isto se dá por causa de dois fatores:
a) Brasileiros têm acesso a mais de 170 países; e
b) Por sermos um povo altamente miscigenado e com raízes genéticas de dezenas de países, podemos ter a aparência de iranianos, chineses, gregos, ameríndios, norte-americanos, russos, italianos e mais uma lista de outros países cujos traços físicos estão presentes também em nossa população.
Outro caso de espião implantado em solo brasileiro é o do “carioca” Gerhard Daniel Campos Wittich, cujo sobrenome real é Shmyrev, conforme relatos do jornal The Guardian.
Tanto Shmyrev quanto Cherkasov se valiam do ardil chamado “dead drop” que consiste em deixar as informações obtidas em locais específicos e de forma física (por meio de pendrive ou outro artifício).
Mas é preciso atentar para o fato de que esses espiões não estão apenas infiltrados no Brasil. Segundo o El País, Argentina, Uruguai, Peru e Equador também estão no rol de países cujas nacionalidades são usadas como fonte de informação para Moscou. Com calma, inteligência, paciência e atuações dignas de um Oscar, esses homens e mulheres russos podem ter coletado e enviado informações imprescindíveis para o planejamento estratégico russo, sobretudo nos tempos atuais onde o conflito com a Ucrânia colocou a Rússia em destaque no cenário geopolítico internacional.
Relatos de cooperação de servidores públicos e autoridades locais desses países, inclusive no Brasil, ampliam a pertinência do debate sobre esse tema. Afinal, o que os impede de enviar informações capazes de prejudicar esses países do ponto de vista estratégico, militar e político? Por fim, fica a dúvida sobre a real quantidade desses infiltrados em nosso território e nos outros países da América Latina.