Em seu já conhecido desafio que oferece “Pix para quem me convencer de que Lula fará um bom governo”, o Deputado Estadual Guto Zacarias fez uma declaração que irritou um entrevistado. O deputado disse que “o Brasil tomou calote de Cuba”. O entrevistado, conhecido como “José Veja Bem”, rebateu, dizendo que “2 bilhões e meio [de dívidas com o Brasil] é dinheiro de cachaça” (sic). O eleitor ainda disse que “Cuba vai pagar isso em charuto.”
José Veja Bem já é conhecido do público de Guto Zacarias, sendo aparição recorrente nos vídeos do desafio.
A Revista Sociedade Militar resolveu levantar essa questão. Afinal, o país caribenho tem mesmo dívidas com o Brasil? Cuba deu ou não deu calote nos brasileiros?
Dívida de mais de 2,5 bilhões de Reais, e crescendo
No mês passado, autoridades cubanas fizeram um apelo ao governo brasileiro para que haja uma flexibilização no pagamento das enormes dívidas pendentes decorrentes de projetos financiados ao país pelo BNDES, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Havana enfatizou sua incapacidade atual de arcar com o montante vultoso.
A dívida em questão já ultrapassa a impressionante marca de US$ 538 milhões, o equivalente a cerca de R$ 2,6 bilhões, de acordo com o jornal Folha de S. Paulo.
O jornal revelou detalhes de uma reunião virtual realizada no dia 11 de setembro deste ano, envolvendo representantes de órgãos do governo brasileiro e de bancos públicos. Durante a reunião, um dos participantes compartilhou informações sobre suas discussões com o vice-primeiro-ministro de Cuba, Ricardo Cabrisas Ruiz, e com Roberto Verrier, diretor da ProCuba, uma agência dedicada à promoção de exportações e investimentos.
Situação ainda pode piorar
“Autoridades do país externaram não possuir neste momento meios para o pagamento das suas obrigações. As autoridades teriam sinalizado esperar algum tipo de flexibilidade por parte do governo brasileiro —por exemplo, um haircut comparável ao recebido no tratamento da dívida do Clube de Paris em 2015 e, diante da escassez de dólares, uso de moedas alternativas ou recebíveis de commodities cubanas— para permitir a retomada dos pagamentos”, escreve o registro da reunião.
Os problemas relacionados aos atrasos no pagamento de projetos financiados pelo Brasil em solo cubano surgiram já em 2016. No entanto, a questão ganhou maior magnitude a partir de 2018, quando os repasses cessaram a partir de junho.
Além da quantia devedora mencionada no relatório, Cuba ainda enfrenta precipuamente um pagamento pendente no valor de US$ 520 milhões até o ano de 2038. Com isso, o total estimado do montante a ser repassado ao Brasil chega a uma cifra alarmante de US$ 1,1 bilhão, ou mais de 5 bilhões de Reais.
As declarações de José Veja Bem, no entanto, podem ter um cunho de verdade. Cuba inesperadamente ofereceu recebíveis da Indústria do Tabaco como garantia para o empréstimo do BNDES. O governo cubano utilizou de sua renomada indústria estatal de tabaco, conhecida pela produção de charutos de alta qualidade, como garantia para obter um empréstimo substancial de US$ 176 milhões do banco brasileiro. Essa estratégia, embora inesperada, destaca a complexidade das relações financeiras entre os dois países e levanta questões sobre a viabilidade dessa forma de garantia em empréstimos internacionais.
Cubanos já deram calote em outros países
Antes de iniciar o financiamento das obras durante os mandatos de Lula (PT) e Dilma Rousseff (PT), os brasileiros deveriam ouvir sobretudo a experiência dos argentinos com os cubanos.
Em 1974, Cuba acumulou dívidas com a Argentina ao adquirir milhares de tratores, caminhões e automóveis. Contudo, até hoje, esses empréstimos não foram quitados. O valor, na época, de US$ 1,3 bilhão, ou cerca de R$ 6,5 bilhões em valores atuais, atualmente corresponde a uma soma extraordinária de US$ 15 bilhões, aproximadamente R$ 75 bilhões.
Além disso, a Venezuela, outro país enfrentando dificuldades financeiras, também concedeu empréstimos de quantias desconhecidas para Cuba. De acordo com o jornalista cubano independente Bóris González Arenas, sediado em Havana, “Cuba não possui recursos”. Como resultado, o jornalista sugere que o governo brasileiro não deve contar com a expectativa de reaver os valores emprestados.
Fontes: Folha de S. Paulo / Poder 360 / CNN Brasil / Guto Zacarias