Documentos referentes a uma licitação do Grupamento de Apoio de Belém (GAP-BE), cuja documentação foi autuada em 16/04/2024 trazem uma listagem de gêneros.
O objeto do processo era “aquisição de gêneros alimentícios do tipo proteína animal para o GAP-BE e unidades apoiadas”. A lista de carnes vai desde coxa e sobrecoxa de frango a camarão seco tamanho médio com cabeça e casca, entre outros itens. O valor total da lista (que pode ser lida neste link) é de R$ 72.700.849,70.
A GESTÃO CENTRALIZADA DA FORÇA AÉREA
O que nem todo mundo sabe é que a gestão administrativa da Força Aérea é concentrada e centralizada em organizações militares chamadas “grupamentos de apoio”. Os GAP são núcleos burocráticos focados numa determinada região geográfica, que na FAB se chama de COMAR (Comando Aéreo Regional).
Isso significa que o GAP-BE, por exemplo, centraliza as necessidades de outras 12 organizações militares da Força Aérea.
Portanto, quando se diz que o GAP-BE gastou mais de R$70 milhões em compra de carnes, muito provavelmente esse montante deve ser dividido por 12.
Isso daria menos de R$ 5.8 milhões para cada organização. Vamos também supor que esse gasto seja anual, isso daria R$ 486 mil/mês para cada uma das organizações militares da FAB.
Agora, introduziremos um elemento estranho à gestão administrativa militar, mas que é a espinha dorsal desse artigo: o auxílio-alimentação.
QUEM COME MAIS, O CIVIL OU O MILITAR?
Em abril, o Governo Federal fechou acordo com as entidades representativas dos servidores públicos federais para reajuste de 52% no auxílio-alimentação a partir de maio de 2024. Com a medida, o benefício passou de R$ 658 para R$ 1.000.
De acordo com o Painel Estatístico de Pessoal do Governo, há mais de 500 mil servidores públicos em atividade.
A matemática básica nos fornece o resultado financeiro do aumento no auxílio-alimentação: mais de R$ 572 milhões/mês.
As informações dadas no início, a respeito de quanto a Força Aérea, em tese, gasta com alimentação de seus militares, vão servir de base para estendermos o raciocínio de gastos para as outras duas Forças, Marinha e Exército em comparação com o servidor civil.
O GASTO ASTRONÔMICO COM ALIMENTAÇÃO DOS MILITARES
A geração desses números seria sobremaneira facilitada, se as três Forças Armadas disponibilizassem dados mais objetivos em seus sites. Mas, esse não é o caso.
Quanto aos Grupamentos de Apoio da Aeronáutica, conseguimos descobrir que atualmente existem 14 GAP.
Vamos considerar que os gastos de R$70 milhões do GAP-BE com alimentação sejam anuais (desprezando gêneros que não sejam carnes) e vamos ser cautelosos (já que não temos todos os dados) e reduzir o valor para R$50 milhões.
Ainda assim, chegamos à estratosférica quantia de R$700 milhões por ano para cada GAP.
Como Exército, Marinha e Aeronáutica não fornecem o quantitativo de suas unidades militares, e muito menos o efetivo de cada uma delas, fomos ao Portal de Dados Abertos do Governo e obtivemos o número exato de organizações militares do Exército Brasileiro, a maior das três Forças Armadas. São 1.407 quartéis em todo o Brasil.
Agora, é só questão de comparar os gastos com militares e os gastos com o funcionalismo civil. E o resultado é dramático.
A GESTÃO MILITAR É UMA TORNEIRA DE GASTOS ABERTA
Finalmente vamos fazer uma comparação entre os dados obtidos sobre o funcionalismo civil e seu auxílio-alimentação e sobre os gastos com alimentação dos militares. Ainda que seja estimada, a conta é muito simples.
Como não dispomos do número exato de OM total das Forças Armadas, vamos lançar mão do efetivo de militares ativos. Eles são 350.000.
Vamos simplesmente dar um auxílio-alimentação de R$1.000 para cada um. Ao final de um ano teremos um gasto de R$ 4.32 bilhões com alimentação dos militares.
Parece alto, mas o número representa 63% do que se gasta com o funcionalismo civil, cujo valor é R$ 6.86 bilhões. E aqui é que a coisa fica interessante.
Se mantivermos o gasto estimado por OM da FAB com alimentação de militares em R$ 4.1 milhões e o aplicarmos às 1.407 organizações do Exército – repare que ignoramos a Marinha – teremos aproximadamente R$ 8.40 bilhões/ano.
Isso significa que o atual modelo de administração militar voltado à alimentação de pessoal faz o Governo gastar 94% mais do que gastaria se os militares recebessem um auxílio-alimentação de R$1.000, e 22% mais do que atualmente gasta com o funcionalismo civil.
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