Enquanto tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei que institui uma jornada de trabalho diferenciada para militares das Forças Armadas que possuem filhos que necessitam de atenção especial, um sargento luta na justiça contra a Marinha do Brasil para que seu filho receba a atenção necessária. Alan é sargento e pai de Gael, que tem transtorno do espectro autista.
É obrigação dos pais prestar assistência aos filhos
Além de cuidar de um filho que precisa de atenção especial, o sargento luta por um direito que, em sua visão, deveria ser automático, já que é obrigação dos pais atender a todas as necessidades dos filhos. Se estes têm algum problema de saúde, é ainda mais importante que os pais tentem solucionar o problema enquanto houver tempo hábil.
Em comentários nas redes sociais do sargento, algumas pessoas destacam o paradoxo da situação, considerando que a Marinha do Brasil patrocina no Rio de Janeiro o “Dia do Autista”, com eventos como caminhadas e palestras.
A advogada da família, Marilia Millard Rocha, busca na justiça a redução da jornada de trabalho do militar, pois ele é obrigado por lei a dar assistência ao filho, o que a Marinha tem negado. Após solicitar a redução da jornada de trabalho e o custeio dos serviços médicos, o sargento – que serve em Minas Gerais – foi informado de que seria transferido para o Rio de Janeiro. Contudo, com a ajuda de sua advogada ele conseguiu cancelar a transferência na justiça. O laudo médico sobre a situação, atestando que a criança não poderia ter o tratanmento interrompido, foi preponderante para a decisão favoravel.
“… os atendimentos deverão ser regulares, sem interrupção e sem data prevista para término. Os prejuízos e riscos da não realização das terapias e tratamentos corretos, conforme citado anteriormente, podem ocasionar danos irreparáveis a Gael, perdas ou regressos, déficit permanente de comunicação e isolamento social além de dependência completa por toda a vida. Reafirmo novamente que é imprescindível a manutenção do tratamento com a mesma equipe de profissionais, uma vez que o quadro de TEA exige um vínculo terapêutico
permanente …” (médica especialista – neurologia da infância e adolescência)
Alan, ouvido pela Revista Sociedade Militar, relata que sua avaliação de desempenho foi prejudicada desde o início da luta pelo direito de assistir ao filho e conta ainda que enfrenta várias dificuldades, desde o descumprimento da legislação que garante atendimento prioritário a pessoas com deficiência até as negativas da Marinha do Brasil em custear o tratamento médico e reduzir sua jornada de trabalho.
A Marinha não fornece o tratamento adequado
O militar, que acabou se transformando em referência para outros pais que enfrentam situações similares, possui um canal no Instagram seguido por pessoas que se interessam pelo tema, argumenta que existem legislações que protegem as pessoas com deficiência e que não há como um militar prever que um de seus filhos nascerá com algum tipo de problema, demandando da instituição militar que esteja preparada para essas situações. Alan, terceiro sargento, contou que algumas pessoas que sofrem com usse tipo de situação acabam pedindo baixa da Marinha por não conseguirem tempo para cuidar de dependentes com deficiência. “A Marinha não fornece o tratamento adequado e também não permite que o militar saia para levar o filho para ser tratado, e às vezes a família não tem um plano familiar ou uma rede de apoio”, diz.
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Acreditando que o Comando da Marinha, atualmente exercido pelo Almirante de Esquadra Marcos Sampaio Olsen, não tem conhecimento completo do fato, já que seus requerimentos teriam sido arquivados, a família espera que de alguma forma a cúpula da instituição tome conhecimento da situação e acabe modernizando os regulamentos. Segundo demonstrou, o sargento não acredita que a Marinha do Brasil iria contra o posicionamento da própria Comissão de Defesa Nacional da Câmara, que deu parecer favorável à projeto de lei que garante a redução da jornada de trabalho para militares que possuem filhos com necessidades especiais.
Na argumentação contra a concessão de jornada de trabalho diferenciada, a Advocacia Geral da União, defendendo a Marinha do Brasil, alega que não existe previsão legal para esse tipo de situação e que a concessão poderia criar “precedente para a multiplicação de demandas da espécie”.
“… A despeito das razões expostas pelo autor da demanda, é manifesta a improcedência da pretensão formulada, face à ausência de previsão legal para tanto… Com efeito, o deferimento da liminar representaria a concessão do próprio provimento final requerido, tornando inócua qualquer manifestação judicial posterior. Acrescente-se, ainda, o risco de criar-se precedente para a multiplicação de demandas da espécie, a ocasionar sérios gravames à Administração Pública”.
Robson Augusto – Revista Sociedade Militar