As operações psicológicas, quando bem empregadas, podem alterar a narrativa de um conflito sem disparar um único tiro e mesmo sem a ajuda das Forças Armadas. Investigações reveladas pela polícia Nacional da Ucrânia em 25 de julho de 2024 se debruçam sobre um esquema intrincado envolvendo cidadãos ucranianos usados em ataques coordenados na União Europeia, supostamente instigados pelo Serviço Federal de Segurança da Federação Russa.
O Início das Investigações para a caçada ao grupo de recrutadores Pali
Relatórios das autoridades ucranianas deram o pontapé inicial nas investigações que desvendaram um complô altamente organizado. Segundo a Polícia Nacional da Ucrânia, um grupo de recrutadores, conhecido como Pali, foi detido. Eles atuavam sob as ordens do FSB (Serviço Federal de Segurança da Federação Russa) para executar crueis e criminosos ataques incendiários em países da União Europeia, visando atingir principalmente estabelecimentos comerciais e centros de ajuda humanitária na Polônia e nos países bálticos.
O organizador do grupo, o recrutador, um morador relativamente jovem, de 39 anos, da cidade de Ivano-Frankivsk, que recrutou vários outros moradores da cidade como cúmplices. Tendo contato direto com funcionários dos serviços secretos russos, foi apurado que os recrutadores recebem constantemente as detalhadas “ordens” de seus supervisores.
Os recrutadores selecionavam cidadãos pró-russos na Ucrânia, que eram então enviados aos países da UE com documentos falsificados. O objetivo era realizar os ataques da forma mais cruel possível, que desestabilizassem a região e principalmente manchassem a imagem da Ucrânia internacionalmente, complicando as relações diplomáticas durante o período crítico de conflito armado em que o governo ucraniano luta por recursos.
“Sabe-se com certeza a existência de vários estabelecimentos comerciais destruídos por um incêndio na Polónia e nos países bálticos. Os agressores também receberam ordem para atear fogo a um dos centros de ajuda humanitária à Ucrânia no território da Polónia. De acordo com os resultados da operação especial, membros do grupo criminoso foram detidos na região de Ivano-Frankivsk.”, informa a Polícia Nacional da Ucrânia
A Estrutura do complô tem seu cérebro na Rússia
O esquema criminoso revelado pelas autoridades detalha uma operação cuidadosamente planejada. Os envolvidos recebiam instruções diretas de seus supervisores na Rússia, com quem mantinham contato constante. As instruções eram claras: atear fogo a objetivos pré-determinados e sair discretamente sem deixar rastros.
A estrutura hierárquica do grupo permitia uma distribuição inteligente e eficaz de tarefas, onde cada membro tinha uma função específica, desde a falsificação de documentos até a execução do plano para o incêndio. Isso mostra não só um planejamento meticuloso, mas também a utilização de técnicas de guerra psicológica, onde a desinformação e a instabilidade são armas tão potentes quanto o armamento físico.
Guerra psicológica e propaganda negativa, muito além do campo de batalha
Marcos Coimbra, especialista em operações psicológicas, explica que estas ações vão além do campo de batalha. “A guerra psicológica se utiliza da propaganda para influenciar não apenas os adversários, mas também públicos neutros e aliados”, afirma. Essas operações são projetadas para moldar percepções e atitudes, alterando o cenário geopolítico sem confronto direto.( COIMBRA, Marcos. Operações Psicológicas, corações e mentes. Disponível em: http://www.samauma.com.br/ . Acesso em: 23 set. 2007.)
Neste caso em especial, a manipulação visava mostrar a Ucrânia – que tem o apoio dos Estados Unidos e da maior parte da população da Europa – como um país incapaz de controlar seus próprios cidadãos, sugerindo uma governança desorganizada e uma propensão à violência de seus cidadãos. Tal narrativa se adéqua perfeitamente aos interesses dos russos, que obviamente se beneficiam de um menor apoio internacional à Ucrânia.
Robson Augusto – Especialista em inteligência, jornalista, militar da reserva
Revista Sociedade Militar