Conforme declarou o Brigadeiro-General Jabari, da Guarda Revolucionária Iraniana, “Juntamente com a operação de mísseis, uma operação cibernética em larga escala foi lançada contra os sistemas de defesa do inimigo.” Ou seja, enquanto as defesas israelenses tentavam identificar os mísseis no ar, eram simultaneamente sabotadas por um ataque cibernético, afetando enormemente a capacidade de neutralização dos projéteis no ar, o que resultou em muitos destes acertando seus alvos. Dentre eles, bases militares, como a base aérea de Negev, com relatos não confirmados de dezenas de caças danificados ou destruídos, supostamente bases da inteligência israelense, e até plataformas oceânicas de extração de gás. Apesar de negarem danos significativos, o atingimento das bases foi confirmado pelos israelenses.
Esse aspecto funcionou também se beneficiando da situação que vem se desenhando a vários meses já, pelo que podemos considerar uma guerra de atrito entre Israel e a Resistência Islâmica, em que as defesas israelenses têm consumido muito mais de suas reservas do que têm conseguido repor, e isso é parte da estratégia iraniana e de seus parceiros regionais. Porém, desta vez a ação iraniana foi diferente do que o ocorrido no passado, mesmo no ataque em Abril.
Ao invés de utilizar foguetes e/ou drones menos avançados e de baixo valor para saturar as defesas e assim abrir espaço para os armamentos mais poderosos, no ataque desta semana a Guarda Revolucionária Islâmica empregou apenas mísseis balísticos, de diferentes classes entre modelos mais antigos e mais novos, maiores e menores, de combustível sólido e líquido, de forma que o tempo de vôo destes foi próximo dos 15 minutos, dando pouco tempo de preparação para Israel também.
Esse evento expõe uma vulnerabilidade que Israel talvez não quisesse admitir: apesar de suas poderosas capacidades militares, suas defesas não são infalíveis e o país ainda pode receber graves danos.
Impacto e mudanças
De acordo com fontes israelenses, o ataque iraniano parece ser o início de uma campanha mais longa, que pode indicar um novo panorama no Oriente Médio. Neste ataque, diferente do ocorrido em Abril, o Irã não agiu de forma contida, como uma demonstração. Naquela ocasião, o ataque foi coordenado por quase duas semanas, com o Irã informando os EUA nos bastidores; O Irã fechou seu espaço aéreo com bastante antecedência, demonstrando que poderia realizar o ataque, a fim de não escalonar o conflito.
No dia primeiro, o Irã não fechou seu espaço aéreo e não fez nenhum aviso prévio. Os estadunidenses só conseguiram observar movimentações que indicavam algo com duas horas de antecedência. Assim, Israel não teve tempo de preparo para responder, nem de coordenar a defesa de seu território com os norteamericanos e outros países da região como a Jordânia.
A mudança de abordagem iraniana pode ser creditada por vários fatores, como os declarados oficialmente de que seria por vingança aos recentes assassinatos das lideranças de Hamas e Hezbollah e de membros da IRGC, mas para além disso, também se deve a uma percepção, de acordo com o revelado pelo próprio presidente do país, Masoud Pezeshkian, que desde o assassinato do líder do Hamas em Teerã, Ismael Haniyeh, os EUA e parceiros europeus negociaram com o Irã um possível cessar fogo em Gaza e o alívio de sanções ao país, em troca da não retaliação contra Israel, o que, segundo o presidente, foram mentiras.
Essa abordagem do novo governo iraniano não agradou internamente, e foi encarada como ingenuidade ou fraqueza, visto até que o mesmo já havia sido apresentado pelos russos no passado com relação aos acordos de Minsk. Não apenas o povo ficou descontente, mas setores do Estado iraniano, o que acarretou na tomada de decisão por parte do Líder Supremo, Ayatollah Ali Khamenei, que ordenou diretamente a realização do ataque por parte da IRGC, assim não dependendo do Presidente, que é abertamente inclinado a uma maior aproximação com o Ocidente.
Respostas e temores
Uma resposta israelense agora é esperada. O último ataque iraniano, em abril, foi recebido com um contra-ataque bastante limitado de Israel. Mas desta vez, o cenário parece diferente. O governo de Netanyahu está sob forte pressão para reagir de forma mais enérgica. Além disso, o ex-primeiro-ministro Naftali Bennett comentou recentemente que Israel tem “a maior oportunidade em 50 anos para mudar o Oriente Médio”. Para Bennett e outros políticos, a hora é agora de atacar o Irã diretamente.
Entretanto, enquanto essa retórica se intensifica, a realidade é que o Irã demonstrou que não será um alvo fácil. Sua capacidade de ataque rápido e sua preparação para uma guerra prolongada mostram que o cenário de uma resposta israelense pode não ser tão simples quanto os políticos sugerem. Além disso, Israel corre sério risco de envolver toda a região em uma Guerra generalizada, o que é visto com grande temor por muitos, incluindo EUA e Rússia. Ambos sabem que uma guerra aberta entre Israel e Irã desestabilizaria toda a região e traria consequências graves para interesses russos e americanos no Oriente Médio.
Nos bastidores, os EUA tentam acalmar os ânimos. Há uma clara preocupação com a possibilidade de Israel, pressionado pelas eleições e pela narrativa interna, decidir por um ataque amplo contra o Irã. Mas as conversas entre Netanyahu e as potências ocidentais têm sido cada vez mais tensas. Enquanto isso, tentam também apelar aos iranianos para que encerrem o ciclo de retaliações, porém com as promessas rompidas, os iranianos aparentam estar mais firmes em sua posição.
Desde a eliminação de Nasrallah, dias atrás, a administração Biden ajustou sua postura em relação ao Oriente Médio. O foco não é mais evitar uma guerra generalizada, mas sim gerenciá-la. Isso ficou claro nas declarações oficiais, onde, embora defendam o “direito de Israel de se defender”, desaconselham um ataque direto ao programa nuclear iraniano. O cenário de guerra iminente entre Israel e Irã já não é mais descartado como antes.
As defesas israelenses não são invulneráveis
O Oriente Médio está em ebulição. O ataque iraniano a Israel foi uma demonstração clara de que as defesas israelenses não são invulneráveis. Mais do que isso, mostrou que a guerra moderna é travada tanto no ar quanto no ciberespaço. A postura do Irã, equilibrando força e cautela, deixa claro que o país está disposto a continuar pressionando, mas sem provocar uma guerra aberta. No entanto, com o governo Netanyahu cada vez mais pressionado, é difícil prever até quando essa contenção será mantida.
As próximas semanas serão cruciais. A reação de Israel ditará o rumo dos acontecimentos, e o mundo assiste com expectativa. Seja qual for o caminho, o que está em jogo vai muito além das fronteiras israelenses e iranianas.