Recém-lançado nos Estados Unidos, o documentário War Game propõe um desafio hipotético em que é preciso salvar a democracia norte-americana dentro da legalidade e sem causar uma guerra civil depois de um candidato derrotado à presidência incentivar um golpe de estado e contar com o apoio das Forças Armadas.
As informações a seguir foram baseadas em artigo publicado pelo jornalista Rodrigo Salem na Folha de São Paulo em 2 de novembro de 2024. Salem é colaborador da Folha e também autor da newsletter Desafiador do Desconhecido.
Em janeiro de 2021, uma multidão de apoiadores de Donald Trump invadiu o Congresso Norte-Americano, em Washington, para tentar impedir a posse de Joe Biden. Eles foram incitados pelo próprio republicano que, na época, se recusava a admitir a derrota e alegava fraude no pleito. Algo bastante parecido com o que aconteceu no Brasil 3 anos depois.
O episódio causou mortes, fuga de políticos e depredação do Capitólio e os vândalos foram reprimidos com o apoio da Guarda Nacional, Polícia e tropas locais de segurança. Mas o que aconteceria se os militares, em vez de defenderem o governo eleito democraticamente, ficassem do lado do candidato derrotado e participassem ativamente do golpe de Estado?
A pergunta direciona toda a produção de War Game, dirigido por Jesse Moss e Tony Gerber, mas idealizado fora da indústria cinematográfica. O escopo do que viria a ser o projeto começou com a Vet Voice, organização que recoloca ex-militares na posição de líderes civis.
A Vet Voice se inspirou em artigo do The Washington Post em que 3 generais fora da ativa pedem para o Departamento de Defesa norte-americano avaliar o cenário de guerra interna motivado por tentativa de golpe ou insurreição com suporte das Forças Armadas por meio de um war-game.
Os 3 generais são Paul D. Eaton (major-general aposentado do Exército dos EUA e um conselheiro sênior da VoteVet; Antônio M. Taguba (major-general aposentado do Exército, com 34 anos de serviço ativo) e Steven M. Anderson (general de brigada aposentado que serviu no Exército dos EUA por 31 anos).
No texto publicado em 17 de dezembro de 2021, eles explicam que o Exército dos Estados Unidos reflete a sociedade e, assim como ela, abriga elementos antidemocráticos radicais.
Segundo eles, os sinais de uma possível turbulência nas nossas Forças Armadas estão visíveis e citaram a participação direta de veteranos e membros ativos do Exército, além de militares reformados.
“Estamos cada vez mais preocupados com as consequências da eleição presidencial de 2024 e com o potencial de caos letal dentro de nossas Forças Armadas, o que colocaria todos os americanos em grave risco. Resumindo: ficamos arrepiados só de pensar que um golpe pode dar certo na próxima vez”.
Frustrada com a pouca ação do governo norte-americano diante do pedido dos generais, a Vet Voice organizou um Role-Playing Game. Ou seja, um jogo em que seus participantes fingem ser personagens fictícios baseados em atributos pré-estabelecidos.
Esse exercício tem o objetivo de encontrar fraquezas no sistema político dos Estados Unidos e preparar as autoridades para uma crise de tal escala.
Experientes em formato simular, os diretores Gerber e Moss procuraram a Vet Voice para formar uma parceria e filmaram as 6 horas da simulação realizada em 6 de janeiro de 2023 para depois editá-la, comprimi-la em 1 hora e meia de duração e dar origem ao War Game.
Segundo o jornalista Rodrigo Salem, o documentário é envolvente e assustador. Em especial por não se prender ao formato teatral da experiência e trazer sequências reais da invasão do Capitólio.
O documentário foi lançado em um circuito mais limitado em agosto de 2023 nos cinemas dos Estados e ainda é inédito no Brasil. De acordo com a Folha de São Paulo, militares aposentados, oficiais da inteligência e políticos republicanos, democratas e independentes que fizeram parte dos últimos 5 governos protagonizam o filme.
Os resultados foram enviados para o Departamento de Defesa dos Estados Unidos.
Em julho de 2023, durante a campanha presidencial, Donald Trump discursou para líderes cristãos na Flórida: “Saiam e votem. Em 4 anos, vocês não precisarão votar de novo. Nós vamos consertar tudo tão bem que vocês não precisarão votar”.
Segundo Salem, a realidade pode ser bem mais assustadora do que qualquer drama.