A Coreia do Norte deu um passo ousado ao enviar cerca de 10 mil soldados para a Ucrânia, onde devem lutar ao lado das forças russas no conflito contra Kiev. Esta é uma das mais significativas movimentações internacionais do regime liderado por Kim Jong-un, que utiliza uma combinação de doutrinação ideológica, incentivos financeiros e controle social para garantir a lealdade absoluta das tropas.
Os soldados destacados para o combate fazem parte de uma unidade de elite, reconhecida por treinamento intenso e fidelidade ao regime. Como explica Ryu Seong-hyeon, um desertor norte-coreano, os militares são doutrinados desde jovens a acreditar que devem sacrificar tudo pela liderança de Kim, sem questionar suas ordens.
Doutrinação militar começa na juventude e oferece oportunidades raras de ascensão social
A doutrinação começa cedo, com a população sendo ensinada a venerar o regime e priorizar o princípio songun, que coloca a defesa militar acima de todas as outras áreas da vida nacional. Jovens veem o serviço militar como uma oportunidade para ascender socialmente e melhorar as condições de vida de suas famílias, especialmente se forem destacados para funções de prestígio ou missões internacionais.
A motivação financeira também desempenha um papel importante. De acordo com o Serviço Nacional de Inteligência da Coreia do Sul, a Rússia paga cerca de US$ 2 mil por mês por cada soldado norte-coreano. Embora a maior parte desse valor seja direcionada ao Estado, mesmo uma pequena parcela desse montante representa uma fortuna em um país onde o salário médio é de apenas US$ 1 a US$ 3 mensais.
Além disso, a oportunidade de deixar a Coreia do Norte e conhecer outro país, ainda que em um contexto de guerra, é rara e desejada. A censura rígida impede que a maioria dos norte-coreanos tenha informações sobre o mundo exterior, tornando missões internacionais uma chance única de sair da bolha imposta pelo regime.
Regime mantém controle total sobre os militares e suas famílias para evitar deserções
Para garantir a fidelidade das tropas no exterior, Pyongyang utiliza medidas extremas. É comum que membros da família dos militares destacados sejam mantidos na capital como uma espécie de “garantia” de sua lealdade. Desertores relatam que parentes podem ser enviados a campos de concentração caso os soldados desobedeçam ou não retornem.
As medidas de controle não se limitam às ameaças familiares. Observadores, também enviados pelo regime, monitoram os soldados e relatam qualquer comportamento inadequado, desde consumo excessivo de álcool até tentativas de adquirir bens não disponíveis na Coreia do Norte.
Historicamente, o regime norte-coreano recompensa seus militares de missões internacionais com status social e benefícios. Durante a Guerra do Vietnã, soldados e pilotos que retornaram vivos receberam homenagens e posições no governo, enquanto famílias de combatentes mortos também foram contempladas com privilégios.
Sessões de autocrítica e visitas a campos de doutrinação são parte do processo de reintegração para os que voltam. Essas práticas reforçam a lealdade ao regime e mantêm os militares sob controle rígido, eliminando qualquer resquício de pensamento independente ou potencial rebelião.
Mesmo diante dos riscos, a ida à Ucrânia é vista por muitos soldados como uma chance de honrar o regime, conquistar privilégios e, em alguns casos, experimentar a liberdade que nunca conheceram em sua terra natal.
Com informações de: Oglobo