Protestos e repressão: por que Moçambique está à deriva após as eleições?
Quem acompanha a situação de Moçambique já deve estar cansado de ouvir falar da mesma história: eleições, fraudes e violência. Desta vez, no entanto, a coisa saiu totalmente do controle. O país está afundado há mais de 50 dias em uma crise social e política, marcada por protestos, repressão brutal e números que falam por si só. Até o momento, são 110 mortes, incluindo crianças, com mais de 3.500 detenções arbitrárias, de acordo com a Anistia Internacional.
A polícia moçambicana, como de costume, não economiza na força. Há relatos de disparos contra civis desarmados, necrotérios sobrecarregados e cidades que viraram verdadeiras zonas de guerra. De acordo com Khanyo Farise, da Anistia Internacional, “o governo da Frelimo optou por uma repressão sangrenta em vez de enfrentar as críticas. O mundo precisa reagir.”
A questão é: alguém vai reagir de verdade? A SADC (Comunidade de Desenvolvimento da África Austral) e a União Africana se limitaram a declarações insípidas e condolências de praxe. As eleições em Moçambique seguem, no entanto, escalando para conflitos cada vez mais violentos.
Eleições de sempre, resultados de sempre, e Moçambique à beira do caos
A crise começou após a divulgação da vitória do presidente Daniel Chapo, da Frelimo, com 71% dos votos. Se isso soa familiar, é porque é. De acordo com observadores internacionais, haviam irregularidades desde bem antes. Assim, Venâncio Mondlane, principal oponente, denunciou a fraude generalizada. Mondlane ficou com apenas 20% dos votos. Posteriormente, rejeitou o resultado e, desde então, vive de forma clandestina. Usando as redes sociais, o opositor tenta organizar protestos, sugerindo sobretudo panelaços e bloqueios de estradas como formas de resistência.
O problema é que a insatisfação vai além do resultado eleitoral. Moçambique está soterrado em corrupção, desemprego e uma sucessão de eleições fraudulentas. Além disso, há uma força policial que parece ver qualquer cidadão como alvo. Mondlane, em entrevistas, já falou sobre ameaças de morte e tentativas de assassinato contra ele. Ao mesmo tempo, seus apoiadores enfrentam nas ruas a repressão impiedosa das forças de segurança.
Repressão violenta e mais mortos do que explicações
Relatos vindos de Maputo e outras cidades apontam que a polícia usou munição letal contra manifestantes. Já são 329 que sofreram ferimentos pelas forças policiais, com outras 110 mortes. Bernardino Raphael, comandante da polícia, foi à TV culpar os próprios manifestantes. De acordo com Raphael, os manifestantes usam crianças como escudos humanos. No entanto, essa justificativa é tão absurda quanto inaceitável. Enquanto isso, a oposição e organizações de direitos humanos não têm dúvidas: a repressão estatal beira o genocídio político.
A Anistia Internacional já pediu investigações urgentes, mas, como sempre, as instituições locais estão ocupadas negando qualquer irregularidade. Para piorar, os protestos contra as fraudes nas eleições de Moçambique estão se tornando mais agressivos. Delegacias sofreram ataques, e até funcionários eleitorais se tornaram alvos da fúria popular. A resposta do governo? Mais violência, claro.
Moçambique à deriva após eleições
Quem anda por bairros como Maxaquene, em Maputo, vê o cenário de um país que está literalmente em ruínas. Pneus queimados, ruas destruídas e pessoas tentando retomar uma rotina que já não existe mais. Jaime, um jovem estudante que decidiu protestar contra as eleições em Moçambique pela primeira vez, resume bem o sentimento. “Estamos lutando por mudança, porque o desemprego e a corrupção nos sufocam.”, declarou ele.
A Comissão Eleitoral insiste que tudo correu dentro da normalidade e que Chapo venceu com “planejamento”. A oposição, no entanto, afirma que os números foram manipulados, o que não chega a ser novidade em eleições em Moçambique. O sistema eleitoral do país parece ter sido projetado para manter a Frelimo no poder, e os cidadãos sabem disso.
A verdade é que ninguém está disposto a intervir, e o povo de Moçambique está pagando o preço por um governo que não aceita críticas, nem o resultado das eleições. Além disso, há uma oposição que, mesmo com o apoio popular, ainda não conseguiu transformar o descontentamento em mudanças concretas. O futuro de Moçambique? É melhor não criar expectativas.