Há alguns dias a Revista Sociedade Militar publicou algumas matérias sobre as novas medidas implementadas pelo recém-empossado presidente dos EUA, Donald J. Trump. Em duas delas, expusemos a questão das proibições de que pessoas transgêneros pudessem servir ao país como militares. O assunto não só não se esgotou, como está dando mostras de que deve se avolumar. Ontem uma repórter da CNN América entrevistou uma comandante militar transgênero a respeito da proibição do presidente Trump sobre pessoas transgêneros servirem nas Forças Armadas.
Segundo a entrevistadora Kaitlan Collins, um grupo grande de veteranos americanos tem criticado a proibição de Trump. Ela trouxe a fala do CEO da Iraq and Afghanistan Veterans of America que salienta que a ordem do presidente “diz aos militares que seu sacrifício não é valorizado”.
Por outro lado, ela diz ter conversado um dia antes com o congressista republicano Dan Crenshaw sobre isso, e ele argumentou que “acredita que pessoas transgêneros não estão aptas a servir.” Literalmente o político afirmou:
“Estou dizendo que, por definição, se você fez a transição para outro gênero, não está atendendo aos nossos padrões médicos, certo?” A repórter retrucou, dizendo que aquela era a opinião dele. Crenshaw disse: “não, não é uma opinião.”
Hoje, a mais recente proibição do presidente Trump está sendo contestada num tribunal por uma ação movida por seis militares transgêneros e dois indivíduos transgêneros que queriam se alistar.
A prova viva contra os decretos de Trump
Kaitlan recebeu a comandante da Marinha dos EUA, Emily Schilling, que fez duas missões no Iraque e no Afeganistão como piloto da Marinha, recebeu três Medalhas Aéreas e um prêmio por Excelência em Aviação. Emily fez a transição há dois anos, e desde então foi promovida por mérito. Ela também é presidente da Sparta, uma organização de defesa composta por militares transgêneros.
A comandante Emily Schilling tem quase duas décadas de carreira na Marinha. Perguntada pela repórter qual é a visão dela sobre a ordem executiva referente aos militares transgêneros, ela disse: “bem, isso me atingiu bastante. Dediquei cerca de 19,5 anos de serviço. Era meu sonho entrar na Marinha e pilotar desde criança.”
“Fiz duas missões no Iraque e no Afeganistão e 60 missões de combate. Ganhei muito valor e identidade com isso. Depois, fui piloto de testes. E as promoções por mérito. Cheguei ao topo da aviação naval. Acho que sou a prova viva de que estamos qualificados para servir.”
Um excerto da ordem de Trump sobre os trangêneros diz “a adoção de uma identidade de gênero inconsistente com o sexo de um indivíduo conflita com o compromisso do soldado com um estilo de vida honrado, verdadeiro e disciplinado, mesmo na vida pessoal”.
CNN entrevista a Comandante Emily Schilling
Kaitlan — Como é para você ouvir essas palavras?
Comandante Emily — Primeiro, quero continuar servindo. Já fiz isso por quase 20 anos. Quero continuar. Não tenho desejo de sair. E o feedback que recebi antes e depois da transição é que isso me tornou uma líder melhor, capaz de me conectar mais com minha equipe de forma autêntica, porque posso encontrá-los onde estão.
Kaitlan — E quando você ouve essa ideia de que, por ter passado por isso, não está apta a servir, como o congressista disse, “que você não atenderia aos padrões…” Você conhece os padrões e os requisitos. Qual é sua resposta a isso?
Comandante Emily — Bem, há muita desinformação por aí, mas sou uma das primeiras aviadoras navais a recuperar minha autorização de voo após a transição. Isso significa que a Marinha foi medicamente conservadora. Vou pilotar uma aeronave de US$ 100 milhões, o F-18. Eles me submeteram a todas as avaliações psicológicas e físicas possíveis. E no final, não havia razão para me manter fora do cockpit. Vemos isso com todos os militares alocados hoje em unidades de combate. Temos advogados, médicos, forças especiais, rangers, e todos estão lá hoje. Se os retirarmos, deixaremos lacunas críticas que levarão décadas para preencher.
Kaitlan — Então, discutimos isso com o congressista. Quero que você ouça o que ele disse sobre isso. Exatamente. E os testes que você faz.
Aqui, a entrevistadora abre para o congressista republicano Dan Crenshaw:
Dan Crenshaw — Eu sei como é a guerra e o que é necessário para ser mobilizado. Eu não pude ser mobilizado devido a problemas de visão [Crenshaw se apresenta com um tapa-olho]. Agora, e se você precisar de vários medicamentos e seu corpo foi radicalmente alterado para outro gênero? Isso dificulta sua mobilização onde precisamos.
Kaitlan [olhando para a Comandante Emily] — Você está basicamente argumentando que você é a prova de que eles estão errados.
Comandante Emily — Eu sou a prova. Meu tempo total de inatividade médica foi de cerca de um mês. Isso é comparável a alguém que fez uma cirurgia simples no joelho. Temos indivíduos que passam por transições sem ficar inativos. É realmente apenas má informação.
Kaitlan — E ouvimos pessoas como o novo secretário de Defesa falando sobre recrutamento, com números baixos, e como precisam melhorar. O que significa quando uma ordem como essa é emitida, dizendo que mesmo que você queira servir, não pode, em um momento em que também se diz que há baixos níveis de recrutamento?
Comandante Emily — Sim. A ordem executiva apenas pede ao Secretário de Defesa que crie uma nova política. E se você ler seu memorando mais recente, a última linha diz que ele apoia todos os membros e famílias das Forças Armadas. Espero que ele mantenha essas palavras.
Kaitlan — O que você diria ao Secretário de Defesa Hegseth, sabendo que ele também serviu?
Comandante Emily — Acho que seria uma conversa maravilhosa. Eu o receberia de braços abertos. Quando as pessoas conhecem alguém transgênero, conseguimos mudar a narrativa. Há muitos equívocos sobre como é viver com minhas experiências.
Kaitlan — Comandante, foi ótimo tê-la aqui. Obrigado por compartilhar essa perspectiva, após essa entrevista de ontem à noite. Muito obrigado. Eu realmente agradeço.